A CONVALESCENTE NO OUTONO
Autor: Bulhão Pato on Monday, 18 March 2013
Revive teu rosto pallido Á chamma do meu amor; De novo com mais ardor Pula em teu seio, querida, O sangue, o prazer, a vida. O sopro que na existencia D'esta luz nos illumina, Não se ha de extinguir jámais; Oh! provém da mesma essencia, Da mesma porção divina, Com que a mão da Providencia Torna as almas immortais! Firma teu braço ao meu braço, Vem commigo respirar Este ar vivo e salutar. Não sentes na luz do ceo, E no perfume saudoso Do bosque espesso e formoso, Que o doce outono volveu? As folhas que pelo chão Crestadas dispersa o vento, Não desprendem um lamento Que intristece o coração!? E a voz d'essa ave amorosa, Que alem na balsa murmura, Melancolico modilho, Não parece a voz saudosa Da mãe que adormenta o filho Entre os braços com ternura? D'aquelle pobre casal, O fumo que vae subindo Em ondulante espiral, Não diz que em volta do lar Se reune a pobre gente, Que já de perto pressente, O frio inverno chegar? Não vês que ha tanta tristeza Na voz que se eleva a Deus Agora da natureza! Oh! mas como aos olhos teus, E como ao meu coração É grata a melancolia D'esta languida estação! Toda a explendida poesia Do ceo, da terra, e das flores, Quando mil cansões de amores Improvisa o rouxinol, Alegrando o mez de maio Desde os clarões do arreból Até que em doce desmaio Nas aguas se occulte o sol, Terá, sim, tem mais frescura, Mais vida e mais esplendor, Mas não tem tanta ternura, Nem respira tanto amor! Paremos aqui, descansa Um momento neste abrigo; O sopro da aragem mansa Anda em roda a murmurar, E um raio de sol amigo, A teus pés se vem prostrar ........................... Oh! que noites de amargura! Que horas lentas de agonia! Que instantes naquelle dia, Quando tu sem voz, sem gesto, Suspensa num fio a vida... Emfim te julguei perdida! Chegára a noite; uma estrella, Uma só, não transluzia No ceo triste e carregado; Oppresso e desalentado, O coração me batia. Pouco a pouco no horisonte Foi rompendo a nevoa densa; Era a vida, a luz, o dia, Aquella alegria immensa, Que no murmurar da fonte, No perfume da campina, Na brisa e na voz divina Do amoroso rouxinol, Seduz, arrebata, inspira, Quando acorda a terra em canticos, Aos raios vivos do sol! «Pois tudo se anima agora, Tudo nasce com a aurora, Tudo é vida e tudo é luz; Só nesta face adorada, Inerte, fria, gelada, Nem um só clarão reluz!» Ouviu Deus naquelle instante A minha supplica ardente; Em teu lívido semblante Vi despontar docemente Um reflexo semelhante Ao que o sol derrama á tarde Sobre as nuvens do ponente. Prostrei-me a rogar então; E essa estrella de bonança, Essa casta divindade, Risonha irmã do infortunio, Companheira da saudade, Que o mundo chama--Esperança-- Senti-a no coração! Com aquelle sol explendido Que rompêra a nevoa densa, E com a alegria immensa Do mar, da terra, e dos ceos, Quiz de novo a Providencia Que eu visse nos olhos teus O mundo, a luz, a existencia! Agora pois, neste instante, Agora, que lá distante, O sino da pobre ermida Dá signal do fim do dia, Co' a prece da _Ave-Maria_, Ergâ-mos, ambos querida, Graças mil a Deus piedoso, Por te haver tornado á vida! Setembro de 1854.
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Comentários
Marcos Sousa
4ª, 27/03/2013 - 00:43
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Grande obra, cheia de belas
Grande obra, cheia de belas frases e pensamentos.