Geral

Nervos D'Oiro

Meus nervos, guizos de oiro a tilintar
Cantam-me n'alma a estranha sinfonia
Da volúpia, da mágoa e da alegria,
Que me faz rir e que me faz chorar!

Em meu corpo fremente, sem cessar,
Agito os guizos de oiro da folia!
A Quimera, a Loucura, a Fantasia,
Num rubro turbilhão sinto-As passar!

O coração, numa imperial oferta.
Ergo-o ao alto! E, sobre a minha mão,
É uma rosa de púrpura, entreaberta!

Falo de Ti às Pedras das Estradas

Falo de ti às pedras das estradas,
E ao sol que e louro como o teu olhar,
Falo ao rio, que desdobra a faiscar,
Vestidos de princesas e de fadas;

Falo às gaivotas de asas desdobradas,
Lembrando lenços brancos a acenar,
E aos mastros que apunhalam o luar
Na solidão das noites consteladas;

Digo os anseios, os sonhos, os desejos
Donde a tua alma, tonta de vitória,
Levanta ao céu a torre dos meus beijos!

Anoiteceu.--Nos claustros resoando

Anoiteceu.--Nos claustros resoando
As pisadas dos monges ouço: eis entram;
Eis se curvaram para o chão, beijando
O pavimento, a pedra. Oh sim, beijae-a!
Igual vos cubrirá a cinza um dia,
Talvez em breve--e a mim. Consolo ao morto
É a pedra do tumulo. Sê-lo-hia
Mais, se do justo só a herança fòra;
Mas tambem ao malvado é dada a campa.

O LAGO

      Scismava um dia na cruel sentença
      Com que a Egreja fulmina a raça humana,
      Deixando impura a fonte d'onde emana
      O sangue que me anima, e a alma que pensa:

      E ao passarem no ceu do meu destino
      As nuvens da tristeza e da saudade,
      Revellou-me o Senhor alta verdade,
      Junto ás margens d'um lago crystalino!

Serenata (A UMA VIZINHA)

Vae serena, desmaiada,
Entornando luar no azul,
A lua, taça quebrada
Dos festins do rei de Thule.

As estrellas maceradas
São como beijos de luz,
Ou lagrimas condensadas
Do martyrio de Jesus.

Serena como uma prece,
Cariciosa como um ninho,
A via-lactea parece
Estrada feita de arminho.

Estrada feita de arminho
E flocos alvinitentes,
Que talvez seja o caminho
Para a morada dos crentes.

*A LYRA DE NERO*

Nos seus jardins pagãos, entre archotes humanos,
Na lyra de marfim sobre as cordas douradas,
Nero vinha cantar ás noutes estrelladas,
Elegias d'amor e canticos thebanos.

Essa lyra do Mal que ouviram os romanos,
Que cantou entre o fogo, as casas abrazadas,
E os lutos, os truões, as ceias depravadas,
Que mysterios não viu, medonhos e profanos!

E, no emtanto, apesar da sua historia triste,
Se os tempos tem corrido, a Lyra ainda existe
Do devasso real, do lyrico histrião...

OS SONHOS MORTOS

Embora triste a noite, a vagabunda lua
Mais branca do que nunca erguia-se nos ceus,
Igual a uma donzella ingenua e toda nua
No leito ajoelhada erguendo a fronte a Deus!

O mar tinha talvez scintillações funestas.
A praia estava fria, as vagas davam ais;
Semelhavam, ao longe, as extensas florestas
Fantasmas ao galope em monstros colossaes.

E eu vi n'um campo immenso, agreste e desolado,
Immerso no fulgor diaphano da luz,
Juncando tristemente o solo ensanguentado
Sinistra multidão de corpos semi-nus!

Á meza do festim, cercada de formosas...

Á meza do festim, cercada de formosas,
O canto dos cristaes e o scintillar dos vinhos
Saudavam juntamente os bellos desalinhos
Das galantes vizões das ceias luminozas!

Molhavam-se em champagne as pétalas das rozas!
E em baixo, a nossos pés, em leves murmurinhos
A gaze sobreposta á candidez dos linhos
Erguia-se n'um mar de vagas caprichosas!

Ali tudo era paz! Nem odios vis nem zelos!
Os labios pois limpando ás rendas e aos cabellos
Da menos trivial das fadas tentadoras,

*Elegia*

Vae em seis mezes que deixei a minha terra
E tu ficaste lá, mettida n'uma serra,
Boa velhinha! que eras mais uma criança...
Mas, tão longe de ti, n'este Payz de França,
Onde mal viste, então, que eu viesse parar,
Vejo-te, quanta vez! por esta sala a andar...
Bates. Entreabres de mansinho a minha porta.
Virás tratar de mim, ainda depois de morta?
Vens de tão longe! E fazes, só, essa jornada!
Ajuda-te o bordão que te empresta uma fada.
Altas horas, emquanto o bom coveiro dorme,

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