a fantasia é uma concha entreaberta onde eu penetro regularmente: onde os malevolentes não entram nem os apóstolos da desventura; nem as recordações traumáticas que me empurraram para o isolamento.
incremento o meu júbilo quando expurgo a alma através da poesia; quando me afasto das guerrilhas torpes para brandir a espada da minha razão; quando expulso os trâmites da controversa vida mundana.
os meus poemas gravam-se na alma para derrubarem os obstáculos que enfrentei; elucidam os rumores que oiço no tugúrio onde habito; afastam as dolorosas lembranças através de vocábulos medicinais; produzem a seiva que coleia pelas veredas da esperança.
transformo qualquer momento em poesia quando repuxo a inspiração desdobrando-a numa terminologia airosa; quando odoro os lugares que percorro impedindo a sordidez que me rodeia; quando transporto nos meus ombros toda a beleza humana.
o palco desconjuntado onde as disputas sobrevêm; onde os clamores da esperança não têm provisão; onde se erigem obstáculos que perpetuam o nosso desconsolo; onde as nossas atitudes encorajam a loucura.
o bem-estar situa-se longe desta vida dissonante onde se preferem os insultos; onde a maioria refreia os desígnios sublimes em prol duma mesquinha afirmação; onde se produzem os tenebrosos eventos das leviandades humanas.
repudio o sofrimento para oferecer aos leitores um pranto enxugado; para dissecar a mudança que abrangeu a minha existência; para estatuir a liberdade no chão fecundo da poesia.
a alma que eu deneguei está agora nos calabouços do meu juízo; nos resguardos das meditações onde eu distendo os versos que escrevo; nos antípodas duma existência benigna.
acelero o tempo para rechear os meus sonhos com mensagens profícuas; com os vocábulos que sustento para banir os abundantes desconsolos; com os tratados que leio e que me legam serenidade.
observo o mundo que me torneia para repelir as suas iníquas leis; para repreender os seus modos violentos; para dilatar os aprazíveis contextos em que a lucidez labora em mim.