os cardos da memória
Autor: António Tê Santos on Monday, 21 November 2022existe um lugar ávido onde dilacero o infortúnio sempre que escrevo poesia; onde tonifico o meu bem-estar; onde esclareço a sensibilidade através dum apurado raciocínio.
existe um lugar ávido onde dilacero o infortúnio sempre que escrevo poesia; onde tonifico o meu bem-estar; onde esclareço a sensibilidade através dum apurado raciocínio.
recordo as peripécias que acicataram o meu engenho e a minha determinação; que erigiram o tugúrio onde me defendi das intempéries; que transformaram as minhas reflexões em mensagens capitais.
a textura da amizade dirige o poeta até um bem-estar que o ludibria: ignora as suas vitórias sobre o temor e a perfídia; instala as suas emoções no palanque da candura para logo as dissolver no desencanto.
derramei a hipocrisia no escoamento da minha consciência para a juntar às angústias e às facécias colossais; e à proeminência dos meus sonhos malogrados; e às numerosas adversidades que enfeitaram o meu regaço.
na letargia me firmo após requerer ao mundo a sua turbulência inspiradora; após matar a saudade e os seus impressivos tormentos; após abolir os meus pudores antigos e as minhas condutas imprudentes.
É o lamento não equivocado
em um momento, a revelação
na minha lembrança estão os oásis fraudulentos que nutriram as minhas rezas pagãs e os meus dislates imaturos; bem como os regatos impetuosos por onde voguei para escrever a minha poesia.
gostaria de volver à infância para purgar os corretivos que sofri; para reunir no meu íntimo os jogos que brinquei; para repor nos meus atos a roda-viva dos instintos; para andarilhar de novo nos trilhos da candura.
serpenteia a liberdade por entre os escombros do despotismo recolhendo os meus embaraços e cuspindo-os para o tinteiro da poesia; encorajando as minhas expedições ao cerne do mundanismo; transferindo para a minha razão os seus fulgentes estribilhos.
aparto-me das multidões para me libertar das suas posturas nocivas: para esgrimir contra as atoardas que injuriam; para espremer as ignomínias que persistem na sua verbalidade.