MARGARIDA
Oh que formosos dias, Margarida!
Esses da tua vida;
E que nublados
Meus dias desgraçados!
Nasci tambem assim risonho e meigo,
Mas hoje apenas chego
O calix da ventura
Á bocca ancioso,
Torna-se a agua impura
E o liquido que bebo
Venenoso,
Sim, venenoso o liquido que bebo.
Nem eu concebo
Como Deus me creasse
Para tormento eterno;
Elle que tão affavel, meigo e terno
Te beija a ti a face
E te embala no collo, Margarida!
A mim dar-me esta vida...
Mas vejo á sombra d'altos edificios
Miudissimas flôres
De tão subtís e delicadas côres
Que se o sol lhes chegasse
Talvez que nem resquicios
Lhes ficasse.
Com uma d'essas azas, estendida,
Me tapavas tu todo,
E d'esse modo,
Com esse escudo,
Eu ria-me de tudo
E levava esta vida alegremente.
Tenho essa fé.
Vejo tambem a flôr que nasce ao pé
D'agua corrente,
Ir tão suavemente
Levada pela agua!
Talvez até sem magua
De deixar sua mãi.
D'esse modo tambem,
Amparando-me tu a mim nos braços,
Eu seguia-te os passos,
Fosse por onde fosse;
E d'essa sorte
Até a morte
Me seria dôce.
Messines.