... 21 DE SETEMBRO

    Ha uma hora ou mais,
    Marina! que contemplo
    A casa de teus paes
    Que é para mim um templo.

    Está a porta aberta,
    E vejo alumiada
    A parte descoberta
    Da casa da entrada.

    Lá andam a passar
    Do quarto onde acabaste
    Á casa de jantar
    Os vultos, que deixaste.

    Os vultos, que os vestidos
    Tão negros que pozeram,
    De luto, tão compridos,
    Não sei que ar lhes deram!

    A tua bella irmã,
    A tua piedade,
    A rosa da manhã,
    A flôr da mocidade,

    Quem lhe diria a ella,
    Tão cheia de alegria,
    Que haviamos de vêl-a
    Assim já hoje em dia!

    É esta vida um mar,
    E bem se póde a gente,
    Marina! comparar
    A rapida corrente,

    Que vai de lado a lado
    Por esses valles fóra
    Sem nunca lhe ser dado
    Ter a menor demora.

    Pára, quando a engole
    Aquelle mar sem fundo;
    Nem pára; é como o sol
    E como todo o mundo...

    Ahi não pára nada,
    Tudo viaja e anda,
    Que a ordem lhe foi dada,
    E dada por quem manda.

    Chega a corrente lá,
    Engole-a logo a onda:
    Depois, que é d'ella já?
    A nuvem que responda.

    Que a nuvem que nos passa
    Pela manhã nos ares,
    Era hontem a fumaça
    Que andava n'esses mares;

    E a nevoa, que tu vês
    Nas ondas fluctuantes,
    Corria-nos aos pés
    Talvez um dia antes.

    A agua é que no giro
    Em que anda eternamente
    Não deu nunca um suspiro
    Em prova de que sente.

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