ACROSTICO DE UNIVERSO

POEMA MOSAICO

 

Meu subjetivo é alcançar perto

Chegar rente

Perto é lugar de quase

Rente é alcançar de repente

O improviso

O olhar em imprevistos

Meu objetivo é desenhar nas paredes

Linhas que voem delas

Linhas que vão

Com o cânhamo queimado

Abstratos de não querer

Absortas em não pragmatismo

Não violência em discordar

A cor da dissonância

Era ocre era outra

Quase não ia investigar incertezas

O som do encontrar longe

Era ocre era Acre

O peixe piava no poço

Pedia açúcar do rio

Pedia açude

Meu subjetivo é dentro da gente

Objetos estão sujeitos

A gêneros inviáveis

Estão sujeitos a reboque

...

Despeça-se de mim

Com palavras macias

Na sua voz estragada por beijos e álcool

Eu suportaria outro algo

Mas contigo não

Não mais esta noite

Ou seria capaz de te jurar amor

Com ópio ou sangue se preciso

Volte

Volte sempre

Sou uma porta aberta

Para sua força bruta

Volte mas vá

E o contrário também

Se você ficasse mais

Acabaria sendo bem humorada

Mas prefiro não correr o risco

De colocar em xeque

Minha má reputação

Além dela

Não perco outra coisa

Aliás, o batom.

Você consome todo meu batom

E eu prefiro que você me queira pintada

A me ver acordar com pílulas

...

É um burburinho antigo

Que o mar traz em fado

Agitando pequenos reflexos

De lâmpadas tímidas

Desta noite de nostalgia

E de umidade

Retorcendo a visão

Dos timbres do alaúde

Numa esperança

De trazer a calma

Aos enamorados

Antes das areias lunares

Desta terra que descerra

Os desejos da melancolia

...

Você mentiu para deus

E foi sincera comigo

Antes que viessem os gafanhotos

Antes que eu aceitasse os dez mandamentos

E as leis de Newton

Você burlou a lógica do universo

E elegeu a elegia da lua cheia

Antes das pragas no Egito

E de Sodoma e de Gomorra

Quis bofetear alguém ou algo

Você chantageou os arcanjos

E subornou seus subalternos

Para me mostrar

Todos os mundos de além

De Einstein Matusalém

E National Kid

Você mentiu para deus

Chantageou os arcanjos

E elegeu a elegia da lua cheia

...

Do buraco em que você entrou

Lá do fundo via-se a luz do sol

E as trevas dos homens

E as trovas dos homens

Eles que se voltavam para Meca

Alguns oram por Meca

Outros miram por Meca

Mas enfim

Você retirou a couraça de medo

De sua coragem

E resolveu tentar viver

A experiência humana

E para não passar batido

Para não passar o protetor solar

Volte-se para Meca

Mire Meca

Mire-se no exemplo de Meca

E depois Las Vegas

Corte na própria carne

Para ter valido

Para que não haja receio

Do suposto degredo espiritual

Do suposto segredo

Promessa que nos cobra exorbitantemente

O preço da agonia

...

Ontem eu sonhei

Que hoje era amanhã

Sem saber se hoje ainda era ontem

Sem saber se partida

Era fim ou começo

Se todas as portas

Tinham a mesma fechadura

Se todas as chaves

Davam para a mesma abertura

Aí eu decidi acordar

Na cobertura que não era minha

...

Este é o noturno de Frederico Eymard

Em seu alpendre lunar

Sua Vênus eleita

De certa feita um lustre e um gesso na copa

Decerto feito pó de lua cheia

Em suas janelas de madeira

Prestes a seu planeta nave mãe

De gametas poéticos e cometas letárgicos

Este seu zigoto zodiacal banheira 1956

Um rabisco em forma crua

A brutalidade de seus degraus irregulares

Pequenas plantas desavisadas

Na fissura ébria de suas escadas

A árvore entortada da rua de seu pouso pleno

Teria que ser mesmo quase em uma lombada

E que tenha sua varanda de suposições

A mais adequada para ejacular cachoeiras

Para doutrinar seus próprios rios

Seu observatório de signos

Sua letra de caos lisérgico

Entre pão e analgésico

A prova cabal

O exame balístico

Frederico Eymard

O místico da matéria em processo noite

...

Meu pai foi um homem que mediu chãos

Como se topografia fosse ciência oculta

Media chãos com critérios que não os posso dizer

Se perdulários ou metódicos

O solo possui estas lacônias

Que ele também praticava à mesa e sofá

Não deveria presumir Lacan ou begônias

Mas premeditava lama e ventania

Às vezes ia à loja maçônica

Depois voltava ao ermo cujo deboche próprio foi uma grande piada

E um tanto quanto perigosa

Prosa de amônia

...

Flauta azeitou a lã

Feita de potássio

Hortelã canela

Cravo e gengibre

Flauta quente

Algo feito de mágica

Algures óleo alga ardente

Algarves chaga de sal

Bruma

Espuma de degredos

Flauta de jogo e jugo

Flauta lã

Tecida de algumas pitadas

De alfazema

Pinceladas de almíscar

No feltro de suas chaves

No véu de suas portas

Céu de escadarias

Suas romarias

Suas melodias

Flauta de lã de crucifixo

Deleite e sacrifício

Flauta cruz de manhã

A estrela do ofício

...

Dá-me mais

De tuas pílulas cósmicas

De tuas miríades de espermas

Desperta que já é hora

De címbalos e anúncio

Decerto é cio que decantamos

Deserto seja cedo

Decerto meu medo

Dá-me mais

Deste remédio

Dá-me desta cura com pressa

Deixe teu perfume vago

Despeça

Dispa-se face aos meus olhos

Diante da noite luz negra

Dia em objetos oblíquos obscuros obtusos

Diga-me tua epopeia

Depois rasgue a seda

Deleite em minhas pernas nação panaceia

Diga-me tua odisseia

Deixe-me os sinos em outra concepção

Depois lança-te em meu cetim

Decora-me em ladrilhos azuis lantejoula

Desfaça-se em miosótis subtraídos

Dispare o orgasmo em tríades de lábios

Desça um pouco a mão

Depois suba novamente até

Decote

Deflora-me alma

Dá-me água

Dá-me sede

Decida-se

Deposita o lenço no bolso beija-me em perdigoto

Deflagra minha toxina noturna

Devasta-me a prolactina a fluoxetina e o estrogênio

Desta gargantilha me sobra o pescoço a esperar o dente

Defina isto ao delírio poente

Devaneio e lua cadente

Desvario estrela cheia

Desatino

Decadência divina

Dilúvios eflúvios apocalipses

Diria a ti apocalipsicose

Diria a ti apocalipsintaxe

Dá-me este cântaro de absintos

Dá-me este cânhamo de absurdos

Dá-me deste chá

E traga absorvente

...

Gesticular tem sido o verbo dos braços

O resto é dança música de pulsar sonetos

Pantomima simula cor um timbre sem adjetivo

Desvenda outono encenando sufocando solo

Fertilizando superfície folha húmus

Vida seca advérbios descontrolados

Lugares perdidos e achados praça sete chuvas

Silêncio erguido em granitos

Gesticulei um lugar que seu desejo foi planta pedra e poesia não

...

Derrubar sequoias

Séquito de doutrinados

Séculos de celulose

Álamos arcos de lapa

Lapela de adereço idade média

Idade alada

Alaridos sem fim

Alaúdes Alaídes flauta doce

Réquiem de ataúde presente

A mão é a mãe dos enganos

Das suposições

O monjolo que compila minha fração de versos

A coisa ganha corpo quando é gás

Atinge forma e silhueta de algo cuneiforme

Inventa uma resina

Movimenta corpos e um fluido gana

A noite é um engenho moinho de homens

Tange um sopro timbre ontem

Assim vira gesto transfuso taciturno

Gira um vento em sentido de contrários

Decantar arquitetura em alguma coisa verde

Cores ocres ferrugens

Ar de contrastes átomo esfera

Dióxido de carbono

Gengibre e begônia

Tinhorão sumo de cores e estrela

Foi como capturamos o movimento em estátua

A dizer horrores

Os pavores e o escândalo em frente aos pombos

Praça pública e o sândalo em verso

Em meio à chuva fina e à abstinência da espuma

Instalada nas janelas de madeixas

A coisa toma um estado fumaça de cafeína

Por dentro dos vidros embaçados

Por dentro dos bigodes empolados

Espumantes charutos e ausências

Em desaviso em cocaína

Vira uma prosa de asneiras

Tingindo a tarde vermelha e cinza

Um fôlego de cansaços

A coisa virou itinerário de improviso

E falou turvamente insanidades

Falou iniquidades em dropes mentolados

Cantou ais dos mais desaforados

Dos quais, extasiado me pego trôpego

Uma visão torpe de andanças

A divisão morre compasso de espera

Andamento alegro ma non presto

A coisa eu me limpo dela de aguarrás

Eu tenho uma coisa satanás que desata

Eu tenho um exu e eu tranco a rua com Marvin Gaye

Um espírito santo me gira em estado branco novo

De lavandas finas

Filigranas

Transprocesso de ourives

Tramo consensos e ornamento o plenário

Decoro o discurso de adjetivos e subo palanque

Contrassenso matéria de marcas d’água

Espelho d’água fábrica de espelhos

Usina de esmeril rouco torno viciado

A carne exposta o osso exposto

Às moscas aos cães e aos populares

Ogiva de pólvora caindo nas polvorosas

Ilhas de pavor miosótis

Sou flor de coisas

Sou sono estéril limbo

Meu gume tece o cio do corte

O fio da rachadura tece um dia

Que delirou um alpendre no ócio

Nó em maciez

Lastro carne de segunda-feira

Rastro cerne de domingo a primeira puta

Esta força bruta

Uma peleja com o chão

Na porosidade do piso

Ardósia bricolagem

Uma labuta sacolão padaria e açougue

Azougue azedume o cume do morro

Safena angina androginia tecido adiposo

O sabor moroso dos dias o teor jocoso dos mistérios

Esta pujança sete palmos cemitério

A parte que me toca

Nesta boiada caminhando a esmo

O torresmo de Zé Catirina

E seu aboio pras almas do necrotério

Laborioso intento

Lânguido lento

Um surrealismo entre as cavas do corpo

Saudosismo na forma muco

Luto de futuros do pretérito

Sem examinar bem a questão

O mérito é de dois pesos

E uma medida grão

É de uma vertigem que embriaga Salomão

Derruba Sansão

E vetos de nações unidas

Eventos ecumênicos

Questão de ordem

Que vão todos ao seminário

Calem-se sem dicionários

E sem endocrinologista

Um carnaval das quimeras

Um cantochão de querelas

Este óleo Amarílis

Ungindo o verde cingindo o verde

Sua talha de madrigal

Sua tara por madrugadas

Este júbilo ofegante

De infernos de dantes e depois

Saem fumegantes os pães da primeira fornada

Saem como errantes os pães da última ceia

A fagulha para o ocidente

A Grécia península pingente pêndulo

Vinícolas látex adegas bodegas  

Um trigo e um joio

Trinta dinheiros e um beijo

A história dos homens de bem

Em versículo bom ladrão mau ladrão

Em testículo besta de Balaão

Outro tipo de obscenidade

Entre raridade de topa tudo e

Domingo Silvio Santos e hóstia consagrada

O vinho unguento de eternidades

Tratamento de enfermidades

Angioplastia cateterismo e catecismo

Proselitismo de evangelhos Allan Kardec e José Saramago

Relativismo fractal

Fugindo no coice macio

De foice e martírio

Eu não sou para compreensão

Eu não vou para sua presunção

Eu saí da semântica

E nem soubera o que é isso

Eu entrei na milonga e não supunha Piazzolla

Eu deixo a sintaxe sem deixar vestígio

Eu entro na milonga sem supor Gardel

Um mel feito de barros em brejos pântanos

Um sal formado de açudes secos vidas secas

Sem açúcar sem afeto

Um sangue em bodas Garcia Lorca em domínio público

Um poema roxo e sujo

Lodo de Carlos Saura

Salmoura em tabacarias cidade baixa

Visgo vidro e corte

Sabor de chocolate

Dezessete anos

Planura agrura penúria penumbra

Langor de lonjura

Latitude longitude atitude

Quebranto leito de quebranto

Miséria rosa de miséria

Uma pétala seiva leite

Ovo membrana cósmica

Gosma sem antecedentes

Sem precedentes de jurisprudências

Romper gema e clara em gente

Engendra absorção de oxigênio

Um absurdo em carbono

Vertigem de amianto

É a vida e a sílica

Música fuligem e estanho

Verdades mentira algo estranho

Deste lado arte ofício arte fato feito

Ar dor

A dor na cruz de lápide

Feitio feição lava pés

Jeito de limpar chagas

A paixão dos jesuítas dos xiitas

Um furor para ressuscitar a arqueologia da páscoa

A ilha de moais

Totens animal e ser humano

A lama a paixão subumana

As vontades soberanas Louis Armstrong

Louis Lane

As pedras de Maomé

Algumas rochas gritam no Tibete

O mantra que sempre foi o rio Ganges

Nilo Tigre Eufrates

Muitas águas filhas de Gandhi

A cidade de Gisé a Ilha de Fidel

Um ramo de murta alecrim um manjericão

O pentágono o pentagrama o Pentateuco

Alguma mera coincidência alusão mística

As aventuras de Robinson Crusoé

Drummond subtraindo rios das pedras

Profecias de Verne

E absurdos da revolução francesa

Da corte portuguesa

Da democracia brasileira

Do rock inglês

Uma coisa foi Walt Whitman

Punhal velado foi MacBeth e Jorge Luís Borges

Morte certa na crônica de Garcia Márquez ou Lúcio Cardoso

Um sertão só que era todos

Caminho de contrário Macabéia.

Casa queimada

Casa de Irene

Casa matas

Casa branca

Casa da mãe Joana

Casa da Crônica Assassinada

Casa verde

Casa Tomada

Por livros e Jogo da Amarelinha

O resto foi um dia só

O resto

Foi o mundo

Que vivo nele

Vendo e ruminando

Um verso gesto indeciso

Leio o mundo com cara de lente e lupa

Mãos e luvas

Dentes dedos e uvas

Cara de óculos embaçados

Cara de pau

Cara de asco mesmo

Decidi que cheguei à conclusão que não vou pedir pra nascer

Nascer e entender e ser entendido

Vou ficar por aqui

Sem tirar conclusões

Vou ficar um pouco

Depois eu vou embora

Vou roubar imagens

Depois vou embora

Num trem Las Vegas para Kabul 

Eu passo as tropas em revista

Um breve lapso entre as luas

E as varandas

Eu passo o texto em revisão

Se me pedem som

Passo mensagem adiante

Não tem mensagem

Passo adiante

A ideia sempre foi uma constante

A burca o turbante a bandana o óculos de sol

Protetor solar filtro infra violeta

Ultra vermelho

Infraestrutura de furtar versos

Tônica dominante vodca

Dó maior sol sustenido

Lá bemol ponte aguda

Navegar

É preciso balsas

É preciso bálsamos

O mundo é urgente

Eu sou um soluço

Um espasmo lacônico

Eu vou embora soprando o perfume da música

Eu vou embora soprando a ferida das palavras

E a poesia não pegou no tranco     

...

Teus versos tem sangue

Catarina

Catarata

E todos os fluidos de teu corpo

Aquecem-se pela noite

Que é quando o pensamento dói

Esquecem-se todas as calmas do dia

E as preocupações inócuas

De tuas tardes solitárias

Em meio aos condimentos e temperos

Metabolismos e fruição

Agitam-se em teu verso

...

As noites de literatura

São mesmo vãs

Esta luta com as palavras

Que sempre perdemos

Sempre aprendemos

Por nunca terminar

Prevalece diante da vida

Precisaria ostentar suor

Não justificaria então

O que nos faz brancos os cabelos

Acaso temos o poder e o direito

De medir todos os revezes

Com ou sem literatura à noite?

...

Eu tenho morfologia de nascença

Eu faço versos none sense

Por correio eletrônico

Mas

Preciso estar aquiescente comigo

Preciso estar doente em minha doença

Preciso enviar contágios

Pela correspondência

Preciso receber presságios

Toda África tem um pouco de universo

Este negócio

Incubadora de Américas

Essa coisa toda

Vontade de desertos

Atacamas aconcáguas

Titicacas niágaras

Viagra e ribeirão arrudas

Iguaçu Paraguaçu

Rio amazonas

Praça do coreto

Rua Guaicurus

Aquela coisa exótica

Meio eldorado dos Carajás

Meio disneilândia

...

Um visionário me dizia

O mundo está prestes a Paquistão

Prestes a Irã

Dizia ele,

Meu irmão, minha irmã

Um bestiário, uma profecia

Não veem o Afeganistão

Não veem o talibã

Dizia ele,

Meu irmão, minha irmã

Dizia Eva

Meu adão, minha maçã

Meu oriente médio

Meu sansão

Minhas sanções

Minha Febre terçã

Mesquita e Ramadan

Dizia Evo

Da Bolívia em gasoduto

A América em luto

Refinando pasta base

Produto interno bruto

Meu irmão, minha irmã

O mundo é um câncer

Nós somos a metástase

Nós somos a metáfora

Somos metalinguagem

O mundo será sempre diáspora

A pele arrancada da terra

Dizia este homem

Com boca sem livros

Sem dicionários

Com língua sem vinhos

E espírito longe das pombas

Girando

...

O que pensam em Bagdá pra lá de Teerã?

E o que pensam pra cá de Tel-aviv?

Terra à vista talvez Guadalajara.

Diadema entrenoites, assembleia de greve.

E todas estas cidades com vocação para Istambul

Fosseis bizâncio

Ou Constantinopla

Fósseis de cidades mortas

Aladas no sonho dos Cadmos

Assim como toda a América recolhe seu quinhão de europas

E assim como a geopolítica não mudaria em Togo

Se não houvesse colônias entre savanas e pré-colômbias

Se não houvesse mastodontes empalhados

A honrarem Gengis Khan Sun Tzu

A vigiarem pasmados a pangea de Marx e a panaceia de Bakkunin

A murmurarem osamas e obamas

A vaticinarem vaticanos e o último dos moicanos

Na última das trombetas jazz americano

E samba do criolo doido

Ah o açafrão dos continentes indianos

E a península dos pecados abaixo do equador

Baixio das bestas, cidade baixa, idade média debaixo dos sacrários

Salvador, El Salvador, santos sudários, casa de mãe Joana

Pai de santo, roupa branca, casa branca

Rosa branca, rosacruz,

Souza cruz

Mãe de santo, saia branca, casa branca

Casa verde, casa rosada,

Cava de exu

Bocas mortas Bakkunins bacardis Bacamartes

Bacanais bacanas planeta Plutão

Bacanais bacanas na terra de Platão

Bacanais bacanas boceta palavrão, pero mas, Pero Vaz

Caminha por Down Jones

Três pesos sete libras duas medidas

Do you (eat my bones)? Mr. Jones?

Catecismo de fuzil

Anarquismo pau-brasil

Picasso fase anil

Existem cios soltos

E cílios inertes

No portão da Nasdaq

Tikrit razão de atacar iraques

Sadams de araques

Madames satãs de fraques

E outros badulaques

Laquê brocal dourado

Lápis lazuli

Ao ar Louvre: Dólar furado

Esquece: papo furado

...

Venho da Rua Coronel Epaminondas

De onde todas as lembranças

Têm atrás uma montanha

Que engole gerações

Venho da Rua Coronel Epaminondas

E devo me manter sóbrio

Venho da Rua Coronel Epaminondas

De onde, conforme foi descrito,

Os pais guardavam brinquedos em caixas

Quando adormecíamos

Hoje vejo estas caixas desenterrando desejos

Venho da Rua Coronel Epaminondas

E acho que dela nunca saí

Venho da Rua Coronel Epaminondas

E lá estava cheio de andorinhas

E te trago apenas este soluço

Do último fôlego de um furacão

Que arrastou varandas e alpendres

Para qualquer lugar no fundo da noite

Venho da Rua Coronel Epaminondas

E provavelmente estou apaixonado.

...

Essa lua minguante

Pendurada no pescoço

Essa equação que não se resolve

O cosmos

Mas que pelo menos eu

Resolvesse-me em seu decote

Minha flor nasce

Abstraindo-se de sua função

Coloria

Nessa praça

Que entorna o sereno

Em suas sandálias

Com quantas helenas

Com quantas troias

Fizeram-se esta noite

Um mar no chão

Eis que emirjam então

Águas-vivas de raro brilho

No seu vestido

Que eu seja o maior profanador

De tesouros submersos nessas pedras

 

As vísceras dele engendram sua morte

Seu cérebro low Power se esquece

De um aniversário importante por semana

Bem que seria um ótimo professor primário de história

Se lembrasse de datas

O cós de seu pijama listrado

Está descosturado, pouco importa

Os pinguins, os leões e os bisões.

Estão no horário nobre do Discovery Chanel

Lá fora o horário nobre tem como vítima o predador

Propaganda enganosa!

Curioso

A publicidade lá fora é a mesma

Da do Discovery Chanel

As vísceras alienadas dele engendram

Uma presa à iminência da

Morte Discovery Chanel

Num instante olha a sacada do sétimo andar

Imagina o pulo

E volta a programação normal

...

A canção também tem carne

Já beijei seus lábios escarlates

Já mordi seu clitóris de ônix doce

Já dormi com quase todas elas

A canção também tem coração

Já ouvi seu ritmo primitivo

Como sexo humano

Já bebi do sangue azul de suas artérias

Já senti a contração de suas vulvas

Que vibram contraltos.

...

Ísis miosótis

Era farinha do mesmo saco

Juntou os farrapos e dois mil réis

Foi pra São Tomé das Letras

Ler Proust

E se dar assim sempre de veneta

Juntou uns trapos em dois mil e três

E vinténs de um japonês

Foi pra Santa Cruz de Cabrália

Ouvir John Cage

E se dar assim entendida de tropicálias

Ísis miosótis

Era madrinha do meu asco

Juntou meus poemas e dois mil escrachos

Foi pra Trinidad e Tobago

Fazer despacho

E se dar assim lixeira de gramachos

Juntou uns achados e dois mil centavos

Pedindo esmola em gramado

Foi pra São Tomé e Príncipe

Fumar Marlboro

E se dar assim ligeira sem engolir sapo

Ísis miosótis

Era rainha com o mesmo papo

Flor de lótus paz e amor corcel setenta e três sem trato

Foi pra búzios

Beber santo daime e tirar retrato

E se dar assim faceira

Morreu semana passada

Dois mil e dez

Dizem que vai ressuscitar aqui mesmo

Num pé de bananeira

Num pé de ribanceira

Onde se deu assim a vida inteira

Sua poesia e caganeira

Sua elegia e macaxeira

Seu madrigal de noite toda

Seu soneto de boite e boda

Sua putaria de erudição e cansanção

Sua olaria de maconha e seu pé de mamão

Sua manjerona na mão e sua trova enfadonha

Sua carvoaria com pressa de negrume

Sua treva de moer fubá e preparar azedumes

Sua usina de pão e betume

Seu unguento chão e chorume

Sua chaga cinge o lume

Sua rosa rósea rosácea

Seu curtume quebranto de hecatombe

Sua resina flora de azougue

Seu apanágio de marasmos

Seu contágio de sarcasmos

Seu sufrágio de pleonasmos

Seu naufrágio de sarcomas

Seu compêndio de sintomas

Seu esplêndido mioma

Seus estupendos sintagmas

Seus fossos fendas sendas

Por onde lhe escorre a anágua

Por onde lhe escorre a mortalha

Por onde o manto se fez navalha

A cobrir orvalho e vergonha

Cava casta

E roxa

Sua coxa em vinagre

Sua virilha em salmoura

Beterraba muco e ovulação de primaveras

Profecia primazia alfarrábio de rabisco

De sexo e de cisco

Praga paga com repertório de ofertórios

Oratório de mau agouro

De bom agrado

Escapulários malogrados

Escapando pelas milongas

E pelo fado

Pelos fatos e pela flatulência

Sebastianismos e idioma castelhano em fluência

Consciência de igreja e puteiro

Olvido e obreiro

Indulgência de Ísis miosótis

Sua reza e indigência

Diligência Ísis miosótis

Sua preza por inteligência

Pede Ísis miosótis na mais autoestima

Milagre Best-seller autoajuda

Ísis miosótis

Brejeira

...

Rio-me das coisas que seguem seu curso

Na absoluta inutilidade

Mas, estão todos animados com as paradas de sucesso.

Toda iniciativa privada implanta os cinco ésses

As paredes se cansaram de ter ouvidos

Agora falam para os esquizofrênicos

Disseram que era importante ir ao velório de Baltazar

Então aqui estou

Rindo-me da minha importância no velório de Baltazar

Pobre Baltazar

Guardou seu riso mais sincero

Para a mulher que nunca o amou

 

 

 

 

II

 

Algumas formas de mosaico,

Pelo esvair das horas,

Do calor e das cores

Desmancham-se num leito sem teto,

Sem janelas e sem portas.

Dissolvem-se paixões

Neste corpo vivo e etéreo.

Mas eis que se erguem

Outros desejos

Numa noite

De tantas luzes

E tanta escuridão.

Daí as formas da cidade,

Formas escondidas que nivelam incoerências

Desse mosaico que pulsa.

Agora dormimos, diluídos no esquecimento,

Queimando-nos num sono lunar,

E das ínfimas permissões

Pisamos em algo que flutua

Seu solo, seu asfalto,

Sua força dissipada

De uma efêmera vontade

De eternidade.

Deita-se a cidade

Dorme, sonha a cidade.

E quando acorda...

A cidade assiste ao ser pisada

A uma inequação de anseios.

...

Nem a ordem dos templários

Nem mesmo os iluminatti

Nem os rosacrucianos

Nem mesmo a maçonaria

 

Nem os alquimistas

Nem mesmo os cabalísticos

Nem são Cipriano

Nem o guardião do graal

 

Nem aleyster crowley

Nem mesmo Zoroastro

Nem os maias incas ou astecas

Nem mesmo os celtas

 

Nem os hindus

Nem mesmo os budistas

Espíritas, muçulmanos, judeus, protestantes.

Nem mesmo os textos apócrifos

 

Nenhum deles previu aquele punhal

De Jorge Luís Borges

...

O discurso é um vão na existência

É quando a ação cai morta numa fenda

O discurso é poço que se cava fundo

Um portal para universos paralelos

Outras analogias

O discurso se distancia do universo original

E de seus primórdios

É uma orgia mental que fecunda os olhos

No entanto, o discurso,

É algo que não se olha senão por dentro

Daí talvez o delírio:

Procurar material para o discurso em tudo que é visto.

O discurso é uma armadilha

Que traiu até mesmo Alberto Caeiro.

...

Ele ouvia

Com seu ouvido

Todas as cores

Numa sinestesia

De ter tido

Todas as dores.

Cansou-se de dar voz às cores

E às dores.

A cor que as bandagens sujou

A cor vermelha

A cor que ele recusou

Quando cortou sua orelha.

Cansou-se de dar voz às cores

E às dores.

E as dores, às vezes.

Cores insólitas

Cores que insultam

Ocres que enferrujam

Seu autorretrato ruivo.

Cansou-se de dar voz às cores

Todo amarelo de girassóis

Todo o amarelo dos girassóis

Simplesmente não quis mais

Escutar as cores.

...

Dizem algumas consciências

Anteriores à minha

Algo que procuro guardar

Nos criados-mudos

Que me pertenceram

Ou em outros que suponho

Pertencerão a mim

Tristes criados-mudos!

Não poderiam ter outro nome

Guardar confidências em suas gavetas!

Além dos analgésicos

Calmantes e cigarros

Para que falariam os criados-mudos?

Se lhes damos uma voz de um sentimentalismo

Quase próprio a eles

Se lhes confiamos algo

Que canta seu canto no sentido de uma dor universal

Que não se reconhece universal.

Antes de adormecer

Depois de se entorpecer

Em alguma espécie de culto

Depositamos neles, nos criados-mudos.

Os objetos pessoais

Antes que qualquer coisa seja feita ou desfeita

Num gesto que se repetiria pela eternidade

Se a eternidade não fosse comum

Como qualquer criado-mudo.

...

Meço a rua que piso

A rua da sua casa

Contabilizo agonias

Meço a porta em que entro

A porta da sua casa

Contabilizo anseios

Meço a língua que entra em minha boca

A língua da sua boca

A lamber ressentimentos

A língua da sua boca

Que profere fonemas em disparate

Meço o prazer entre seus seios

Contabilizo outras seivas

Não me peça madrigais

Me peça madrugadas

Não me peça canções ou ais

De ouros ou de espadas

Ofereço-te auroras chapadas

E putarias imaculadas

...

Este veludo

Passeia pelo itinerário premeditado

Dos teus dedos

Dançando pelos gestos

Patinando por formas

Este veludo

Agora é artesanato

E dos gestos poderia mencionar poesia

E dos dedos poderia alcançar galhos

E do veludo fazes flores

Mas num descuido

Todas as pequenas flores de veludo

Caem na poça d água

Pequenas pererequinhas

Boiam num poço de ternura

E poesias obscenas

Bocetinhas nadando

Bocetinhas de veludo

Conchas abertas sem ostras

Ornamentos côncavos debaixo d água

Agora são meus dedos

A introduzi-los em seu clitóris afogado

E as águas nos consomem

No artesanato das bolhas

E o itinerário do veludo

São agora línguas e devaneios.

...

Mais um homem-bomba rumo a algum diretório acadêmico

Chá de camomila, chá de cogumelo.

Mais um jornalista esloveno sequestrado no Iraque

Chá de camomila, chá de cogumelo.

Mais um presidente da direita cristã eleito

Chá de camomila, chá de cogumelo.

Mais um ansiolítico na alta madrugada

Chá de camomila, chá de cogumelo.

Mais um homicídio na esquina e

Mais uma medalha de ouro para o Brasil

Chá de camomila, chá de cogumelo

Verás que o filho teu não foge à luta

Chá de camomila, chá de cogumelo.

Mesmo que fosse urgente fugir à luta

Chá de camomila, chá de cogumelo.

Da mais doce baunilha

Do mais doce caramelo

Chá de camomila, chá de cogumelo.

...

Não tenha tanta histeria, meu bem,

O disco do Bob Marley decerto nos ajudou

E orgasmos não são tão raros

São como baratas, meu bem,

Espere por elas inerte.

Elas virão!

Meu coração inchado

Ainda não verterá nenhum fluido inédito

Nem como estes que nos unem agora

De maneira primal e promíscua

Que nos unem como cães na esquina

Na iminência do apedrejamento dos populares.

Nestes lençóis está a sujeira

Que reproduzimos

Dos aterros sanitários,

Dos esgotos

E das pias batismais.

...

Certas vezes me abstive

Aliás,

Muitas vezes me abstive

Das tardes ao lago

No “observatório das carpas”

Como se carpas fossem espécimes

Com certa instrução

Evolução,

Como se elas intuíssem algo

Mas me abstive da nossa intuição

E hoje a vida é algo que passa

Em meus pulsos que tanto quis abrir

Abstive-me do pulso que pulsava em nós

Agora estou num lugar desconhecido

Que não aceita o perdão

Se fosse seu o sentimento,

Perdoaria minhas abstenções?

Primeiro me perguntaria se você se lembra

Da observação às carpas

Concorda-se com o grau nulo da intuição delas

Não sei mais o que faço

Nem sei se teria o que fazer

Só sei que no quarto ao lado

Está meu neto

Não pensa em outra coisa

Esse tal de Kurt Cobain

Que soa como o primeiro advento

A se abster da memória

...

Meu substrato não sêmen

Minha semente um soneto

Minha semântica não sexo

E solidão minha sintaxe

Silêncio no saguão

Soletro sussurrando estas sílabas

Com a sonoridade de solfejo

Hoje vejo

O que minhas amantes já distantes

Provavelmente percebem

Minha metafísica

Está nas palavras

Não nas genitálias

...

O corpo percebe a forma

E tenta capturar seu movimento

A forma desenha-se a si

Retirada da paisagem

Como a chuva é anunciada

Por nuvens escuras

O corpo penetra a forma

Utilizando-se de seu pênis

O corpo recebe a forma

E tenta codificar seu trânsito

A forma dança num cenário hostil

Longe de qualquer palco

A forma transfigura o corpo

Como o sândalo perdido

Traz o devaneio

O corpo é penetrado pela forma

Utilizando-se de seu ânus

...

O descuido de seu adormecimento

É um sinal casto nesta sua cadeira de balanço

Qual pêndulo designando desejos

Mas do recolhimento e recato das meias de lã

É um contrassenso, um contraponto

A todos crentes da beleza óbvia e imediata

E os sinos já não repicam

E as retretas já se foram

É como se eu tivesse quatro patas

De um gato arisco

Subo ao sótão como se subisse a outra atmosfera

E lá está seu breve resumo

Um alfarrábio amarelo-gualdo

Cóptico, aramaico, tupi-guarani

E toda a excentricidade que já lhe é comum

Antes que o galo cante

Desço as escadas

Não encontro vida ou morte

Na topografia de sua silhueta

Talvez já se percebesse morta

Portanto morte não há mais em ti

Não na superfície de tua fronte

Dividida em duas por um machado

Atesta a vida que não permanece nem nas pupilas que inda brilham

Mas estas se perderão

Assim como alfarrábios

...

Se tivéssemos um piano

E compuséssemos uma valsa

Sobre o tempo que nos falta

E você correspondesse

À divisão das notas que eu tocasse

Harmoniosamente se espreguiçando

Sensual sobre o instrumento

Se tivéssemos um piano

E você interpretasse

Uma canção que garantisse

A paz por algumas horas

Enquanto estivéssemos acordados

Depois dormiríamos

Mas não temos um piano

E eu espero o seu canto como um lobo

E um lobo não distingue um cisne de um canário.

...

No apartamento trezentos e dois

Deste prédio azul inacabado

Mora o senhor José Maria Otoniel das Chagas

Que caminha pelo bairro com sapatos bem polidos

Que visita antiquários

Que tem o receio de não poder deixar um dia

(mais que a herança para o sobrinho )

As pegadas dos seus sapatos bem polidos

No intuito de que alguém o siga

Sua boca seca

E não há quem a irrigue

Nem com água, chuva, beijo ou coca-cola

Pois seus sapatos bem polidos

Não deixam rastros

Escapam pela rua apressados

Como se fosse deles o sobrenome do dono

...

Alba me mostrou seu quarto

A respeito de eu não ter a consciência

Do que viesse a ser uma cama de viúva

Realmente constatei

O que vem a ser uma cama de viúva

A respeito de eu não ter o conhecimento

De que Alba se enviuvou da vida

Passei a supor seu sono

Sem que sequer algo lhe tivesse sido ingrato

Jazesse morto penetrando suas narinas

De calma laboração pela madrugada

Há algo mais vivo que a calma?

Esta que talvez a morte inquieta nunca encontrará

Mas de todos os revezes

Que bagunçam seus lençóis

E fazem a ação de suas pílulas

Deveria haver um matrimônio

Com as forças que compõem a noite

E vem acariciando seu sono

Enquanto a primeira fornada de pães

Sai fumegante

Para alimentar as substâncias do dia

Outro poema que Alba não isenta de hostilidade

Mas, enfim, um poema

...

Sou Reginaldo Miraflores

Cantador de arremedos

Perdoem-me se lhes furtasse o poente

É só poesia

Sou Reginaldo Miraflores

Encolhedor de rios

Eu e meu séquito de desalmados

Passearemos em sua rua

A fim de fazer cortejo solene

E engolir o horizonte em verso

E regurgitar o verso em voo

Voar o horizonte

Perdoem-me se lhes tirássemos as certezas

É só delírio

Sou Reginaldo Miraflores

E eis que estou no seu jardim de begônias

Eis que estou no canteiro central

Com minha viola e meu desarranjo

Pois que não sou poeta de arcanjos

Nem cantor de benfeitorias

Estou passando meu chapéu em sua freguesia

De Panamá e ambrosia

Perdoem-me se não lhes faço

Elogios ou elegias

Perdoem-me se lhes reconheço

Apenas as madalenas

Perdoem-me

Se bem me lembro

Helena e seus novelos

Novelas e novenas

Não nos perdoariam as marias

Sou Reginaldo Miraflores

E esta é minha confraria

De desgraçados e cães com berne

No cerne, famintos

Na certa, poetas

...

Teus olhos subornaram minha alma

Tua boca confiscou minhas vontades

Teu vestido roubou meu sono

Agora morderei tuas tardes de domingo.

...

Dizem os anjos que Deus está meio gagá

E queria desfrutar na terra

Com os pelos brancos de seu escroto imaculado

Das delícias do orifício

De onde vem a vida

...

Eu faço rock

Eu faço manhã

Eu faço bomba e amor

E tenho muito sono

De manha

Eu faço traque

Madame satã

De fraque

Yucatan

De araque

Nova Iorque

Novo Iraque

Depois de saddam

Vã madame george

Bush no paraíso

Na boca do porco

Uma maçã

Na língua do povo

Leviatã

Manhatã

E dropes de menta

...

Eu não devo ter nascido

Devo ser um pequeno pesadelo

De um exu macambuzio

Predileto de um pai de santo

Que pariu um diabo

Em desmazelo

Eu não devo ter morrido

Devo ter ficado por aqui

Sem saber como me manuseio

Masturbando o mundo

Penteando seu pentelho

Com asseio

De macumba e búzios

Prediletos de uma mãe de santo

Que pariu um domingo

Em desconcerto

...

 

 

MARILDA MAGUEZAL

 

José, você não vem

José não veio

Quantos homens eu tenho em você?

Que se esvai em maresia, você

Meu homem de sal e de areia

Você não vem me extirpar os devaneios

Você não veio

E o relógio decantou a lavanda

Dos lençóis

Você, meu homem de sol

E centelha

De asseio e pão de centeio

A me lavar manhãs

Mas você não veio

Você não vem e eu sentei-o

Em minha cadeira predileta

Senti-o cio

Depois examinei meu frio e meu calor

Ao torpor de sua carne

Exangue

Farta e retraída

Fatigada e fatiada

Nestas minhas fagulhas de amor

No dínamo de minhas horas

Você não vem no dízimo de minhas preces

Nas dízimas de minhas réstias de lua

Na fração corpórea

Das estrelas que carrego

A esperar

A semear

Meu desejo recôndito

Nas cavas de germinar gerânios

Nas covas de profanar crânios

Nos cânhamos castos

Em sua pele bruta de cravos

Canela

E sementes de bromélia

José

Você não veio

Você não vem

Você não tem

O direito de besuntar poesia

E vagar errante sem meu júbilo

E ofegante sem meus óleos

Seus azeites moram em mim

Seus ópios e ócios

Seus ódios

José não veio

Afanar-me um jasmim

E eu farfalho o alpendre

Desdenho meu seio sem o leite

Que te sacia

Que me perde em exegeses

E me torna a vadiar

Por um jardim de hibiscos enxertados

De matizes e matisses

Numa colônia de cores

Que eu torno opacidades

Que eu torno cortina de obscuros

E eu escureço a rosa louca

No meu compêndio de cousa pouca

Em tristes psicotrópicos

Em chistes utópicos

Delirantes de minha solidão

A tarde vagueia prozac

E eu prosaica

A te tecer um agasalho

Este assoalho rangendo em desvario

Você não veio

José

Meu meio meu fim

Meu começo arrancado de mim

Verdade adorada

Jaz

Traz-me um acalanto

Faz-me um fumo nas ideias

Cessa esse canto de sereias

Esse banto de medeias

José

Minha ventura desventurada

Minha cor descolorida

Minha dor mais dolorosa

Mais jocosa

Meu mistério mais mucoso

Mais idoso

Mais bondoso

José não vem

José, você não veio

José

Marchando

Lustroso

Pelas lendas do caminho

Pelas sendas dum pergaminho

Com rama de murta

Com sumo de hortelã

Poções de boldo alecrim

Monções de manjerona

Cansanção e funcho

José,

Eu sou a erva daninha de sua obra

O quebranto que te faz voltar

Foi cândida macumba

Macondo de orações furtivas

Foi uma homilia

De subterfúgios

Foi um sermão

Tão quente quão morno

Oxalá fosses frio

Como um cão morto

Em comum acordo

Caminhando no mar ressuscitado

Entre uma treva da fenda

E uma trova mais funda

Falo calo

Halo

Rosa cálida

E findo

Peço meço

Prosa fálica

E cesso

Estou árida de seu açoite

Afoitou-me à noite

Um desejo azougado

Malogrado

Estou a chorar no tear

Num longo bordado

Eu teço os dias

Que te compõem prismas

Que te superpõem topázios

Turquesas e turmalinas

Que te põem reto e conciso

Em usina de amianto

Em resina de silício

Vem José

Calcular-me as auroras

Subtrair-me os crepúsculos

José não veio

Não veio nosso filho

De fio teia e profecias

Eu professava minha descrença

De José não vir

Não rir

José não vem

José não vá

Irei à ira

De meus saravás

Meu satanás

Minhas pajelanças

E curandeirismos

Iemanjá me traz

As águas de meu naufrágio

Os abismos de meu sufrágio

O chão do meu apanágio

E o clarão deste adágio

Valsa triste

E o maldizer de meu vernáculo

Eu pedinte

José não vem

Abrandar a mendicância do espírito

Eu

Moribunda de almas

Vagabunda de lamas

Eu errática

José não vem

Tenho premonição de ventania

E a tempestade é só minha perdição

Eu sou Marilda manguezal

Doravante

Sou doída da dor

Que deveras nem sinto

Mas sinto o vendaval

Parece-me o oceano

A vir morrer

Em meus pés

A vir descansar em meus poros

Pó de pedra e lua

Rocha e caminho

Descaminho

José não veio

Entregar-me embornais

E ais desaforados

Desafortunado mal

É você a vaticinar minha tumba

Você não veio

Você não vem

José

Acalma o cântaro

De mulher doida

Esse cântico de guernicas

Esse bálsamo de arnicas

Esse sândalo aquela tâmara dama da noite

Sem ir ou porvir

Sem devir o polvilho de sua massa

Sem seu chumbo

Seu estanho desfeito

Sua argamassa e minha má feição

Minha afeição por pães

De outras alvoradas

De três galos em não

De sete anjos no chão

Sete anjos no trigo

Sete anos

No jogo e no jugo

Subjugada pelo sol dum Salomão

Pelo salmo dum pai Serapião

José

Você não veio

José

Não vem mais

Exploro de seu vocábulo

O almíscar

E o malte e avelã

Oh perfídia perfeita!

Numa liturgia de desgraças

Numa eucaristia de tragédias

Numa litania de verdade

Oh verdades perfeitas, José!

Sua catadupa seu cadafalso

O alheio em ti

No cantochão dos monges

Os terapeutas os hermeneutas

Não te evocam do fosso

De minha entranha

Minhas reentrâncias

Em oníricos entrechos

Do tutano viscoso

De sua seara de visgo

Do delta de suas vontades

À catarata de minha agonia, José!

O escrutínio de seus caprichos

As cartas

A quiromancia

Minha sorte em suas mãos

Meu pranto a seus pés

O assombro, José.

A penúria

A penumbra

De minha alma

José vem, venha e não volte.

Com seu sêmen

Escalando a fissura ébria

Do sopro

Com seu Iêmen

Subindo por revoluções

Etéreas

Do céu da minha boca evanescendo

O sono da ranhura

Você, dono de minhas hachuras.

Dono de minha alcova

Cantoria e cantilena

Aboio lânguido

Quimera querela paixão

Receio de morte

Morte de estrelas sujas entre nuvens.

E a noite cai na Guanabara

Como um império etrusco.

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