DUVIDA

Amas-me a mim! Perdôa;
    É impossivel! Não,
    Não ha quem se condôa
    Da minha solidão.

    Como podia eu, triste,
    Ah! inspirar-te amor,
    Um dia que me viste,
    Se é que me viste... flôr!

    Tu, bella, fresca e linda
    Como a aurora, ou mais
    Do que a aurora ainda,
    Mal ouves os meus ais!

    Mal ouves porque as aves
    Só soltam de manhã
    Seus canticos suaves;
    E tu és sua irmã!

    De noite apenas trina
    O triste rouxinol:
    Toda a mais ave inclina
    O collo ao pôr do sol.

    Porquê? porque é ditosa!
    Porquê? porque é feliz!
    E a que sorri a rosa?
    Ao mesmo a que sorris!

    Á luz doirada e pura
    Do astro creador.
    Á noite, não, que é escura,
    Causa-lhe a ella horror.

    Ora uma nuvem negra,
    Uma pesada cruz,
    Uma alma que se alegra
    Só quando vê a luz

    De que elle, o sol, inunda
    O mar, quando se põe!
    Imagem moribunda
    D'um coração... que foi!

    Uma alma semelhante
    Não póde captivar
    Um rosto tão galante,
    Um tão galante olhar!

    E eu vi os caracteres
    Que a tua mão traçou:
    Mas vós... ah! vós, mulheres,
    Quem já vos decifrou!

    Mal te sustinha o pulso
    A delicada mão!
    Sentia-te convulso
    Bater o coração!

    Via-te arfar o seio...
    Corar... mudar de côr...
    E embora, ah! não, não creio...
    Tu não me tens amor!

Portimão.

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