Farrapo...
Foste tecido vistoso,
vestiste-te e deixaste-te vestir,
moldaste-te a vários corpos,
nos tempos áureos do teu existir...
Veio os anos,
veio as modas,
e tu foste-te adaptando,
à necessidade por vezes nem sempre tua,
mas daqueles que te foram usando...
A tua textura mudou,
o tempo esse não perdoa,
a mão que outrora te afagou,
é a mesma que hoje te magoa...
Tão injusta é a vida,
tudo se rege pela vaidade,
ninguém se compadece do que é velho,
parece que tudo tem validade...
Foste sendo rasgado,
sem te puderes defender,
aquilo que foste já ninguém lembra,
apenas tu não consegues esquecer...
Não tens o mesmo vigor,
nem a beleza do passado,
mas tens tanto ou mais valor,
que aqueles que te puseram de lado...
Nunca foste dono do que é teu,
nem sequer do teu caminho,
andaste sempre à mercê,
das tesouras do destino...
Cozido a sangre frio,
por agulhas enferrujadas,
lá te foste tu curando,
da vida e das suas golpadas...
Trapo velho ou farrapo,
é o nome que te dão,
olham-te somente por fora,
ignorando que ainda tens coração...
Hoje não te veste a vida,
apenas te serve a tristeza,
estampada no teu enrugado,
cheio de sabedoria e riqueza...
Se caíres no chão,
ninguém se baixa para te erguer,
como já não cobres os ideais,
até censuram o teu sofrer...
És retrato da vergonha,
mas nele não te reconheces,
muitos sem terem molduras,
são aquilo que tu pareces...
A única coisa que pedes à vida,
é que ela se abrevie na morte,
para que pares de andar à rola,
e encontres finalmente o norte...
Que te deixem ir num sono brando,
que o fim te mostre lealdade,
já que a vida não te pagou em honra,
que seja a morte quem te ofereça a dignidade ...
Ártemis
Comentários
josé João Murti...
Dom, 24/11/2013 - 21:18
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Poema sentido com travo de amargura.
Gostei do poema, sentido, transportando alguma amargura. As coisas mais importantes na vida somente são valorizadas depois que passam ou se perdem. Mas tudo é efémero, e os trapos velhos não fogem à regra nesta vida transitória, no qual tudo passa e alguma coisa se transforma. Vi alguns dos seus poemas, gostei, mas este chamou-me a atenção por ser diferente, senti nele alguma amargura em contraponto com a fugacidade dos outros. Por vezes estamos com muita gente ou caminhamos no meio da multidão, mas estamos sós, prevalecendo o ruido do pensamento e das imagens que o norteiam. Gostei e gosto da forma como escreve, põe expressões e sentimentos, que nos levam para alem das palavras e linhas que lemos.
Obrigado pelo poema.
Ártemis
2ª, 25/11/2013 - 12:18
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Caro amigo João...
Este poema de fato foi escrito com algum travo de amargura sim, porque existem coisas neste mundo que me envergonham profundamente, e me desacreditam...e por isso a minha indignação é tanta que de alguma forma quero eternizá-las na minha escrita. Porque cala-las é consenti-las, é ser conivente e isso recuso-me a ser...
É muito triste ver a pobreza de espirito de alguns para com outros, é revoltante os ditos mais fortes(sem o serem), humilhem os mais fracos(não o sendo)...ou simplesmente ignorá-los, porque vejo e sinto que existe muito pouco compaixão neste mundo.
Podemos não conseguir fazer nada, podemos sentir-nos impotentes mas o respeito pelo sofrimento alheio tem de existir, não deve ser um opção, mas sim uma realidade uma obrigação.
Todos sabemos para onde caminhamos, a velhice é uma meta à qual tarde ou cedo lá chegaremos, não conseguimos enganar o tempo nem tão pouco a lei da natureza. E a sorte também não nos pertence...hoje pudemos ser tudo mas amanhã pudemos nem nada ser.
Seremos apenas e só o que carregamos no coração e o que suportamos na alma.
Obrigada por me ler...e obrigada pelas suas palavras que assinam as minhas!
Abraço
Ártemis
josé João Murti...
2ª, 25/11/2013 - 17:41
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Gostei das palavras do seu
Gostei das palavras do seu comentário, estão para além do momento sensível da poetisa, são intrínsecas a um ser humano bom, preocupado e solidário integrando uma sociedade cada vez mais individualista.
Na verdade os processos de evolução, muitas vezes estão correlacionadas com as lições da vida. Se o ébrio deseja libertar-se co alcoolismo, encontra com mais facilidade quem lhe sirva um novo trago, ao invés de quem lhe dei um pão.
A grandeza da pessoa pode ser medida pela sua capacidade de serviço ao próximo, de humildade e de amor.
A pessoa grande chama a atenção e projeta sombra, mas uma grande pessoa, onde quer que se encontre, torna-se claridade impagável, apontando rumos libertadores.
É bom encontrar pessoas, cuja visão se estenda para lá do seu próprio umbigo. Obrigado pela resposta ao comentário e em sequência das suas palavras irei plasmar um soneto "Mendigo da Alma" Um abraço.
Madalena
Dom, 24/11/2013 - 23:00
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ROXO ESSE SENTIMENTO, TRISTE
ROXO ESSE SENTIMENTO, TRISTE PARA QUEM ESTÁ VIVENDO ESTE MOMENTO!
DE FARRAPOS PELO TEMPO!
ABRAÇOS!
Madalena
Dom, 24/11/2013 - 23:07
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Ártemis; olha a cor da
Ártemis; olha a cor da paixão! O que está acontecendo com o seu coração?
Seus poemas são diferentes...Mas o poeta escreve o que sente!
Ártemis
2ª, 25/11/2013 - 12:30
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Minha doce e querida Madalena...
Os meus poemas levam muito da minha alma e da pessoa que sou...felizmente a poesia permite falar do que nos apoquenta o ser, dá voz ao que nos invade.
Tudo serve na poesia, porque ela tudo faz o favor de aceitar...por isso uso-a não só para falar do convinente, abuso-a de quando em vez para falar do que muitos querem calar, ou gostariam que nem sequer se lembrasse.
Madalena sou uma mulher perfeitamente consciente de mim e do mundo que me rodeia, por isso farei da minha humilde escrita veiculo das minhas emoções sejam elas quais forem...
Eu não me mudem...é o mundo que me muda o olhar que por vezes tenho sobre ele, apenas e só isso!
beijo grande mamy
Ártemis
Madalena
2ª, 25/11/2013 - 18:59
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Ah! Filha linda! Desculpe, eu
Ah! Filha linda! Desculpe, eu sei que a poesia voa nas asas da nossa imaginação! Sei também que isso não é motivo de preocupação!
E sim, de emoção!
Abraços minha "LINDA"
neooneeon
3ª, 26/11/2013 - 13:40
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"Não tens o mesmo vigor, nem
"Não tens o mesmo vigor, nem a beleza do passado, mas tens tanto ou mais valor, que aqueles que te puseram de lado", é a mais pura verdade, tanto que não dei control c - control v, não quis copiar, digitei este trecho do poema neste exato momento, quis sentirum pouco por conta própria o quão verdadeiros são estes versos...
Adorei o poema, reflete bem o descaso que a sociedade atual tem com aqueles que deveriam ser o mais respeitados ou venerados, que possuem sabedoria, e é triste ver quando a sociedade consegue esmagá-los... Da minha parte fico torcendo para que eles sejam maiores do que tamanha pequenez e covardia por parte de ideais modísticos pobres e que o vigor do pensamento e da experiência sejam sempre um alicerece poderoso, ainda que o corpo físico ainda não o seja, assim como desejo sê-lo, ainda que tecido velho...
Parabéns pela magnitude desta obra poética!
Abraços,
Neo.
Ártemis
3ª, 26/11/2013 - 14:34
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Neo
sê bem vindo à minha escrita, é um prazer saber que tão bem sentiste estes meus versos.
Porque de facto eles para além de quererem ser lidos muito mais querem ser sentidos, esta é a grande ambição da minha parte. Por isso muito obrigado...e sou igualmente grata pelas tuas palavras, demonstra que não estou só neste meu sentir.
Abraço
Ártemis
Gila Moreira
3ª, 26/11/2013 - 14:19
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Poema que retrata o não
Poema que retrata o não respeito pelas almas sábias. Gostei imenso de ler-te.bjs
Ártemis
3ª, 26/11/2013 - 14:35
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Gila...
sê bem vinda...
sou muito grata pelas tuas palavras e pela tua sensibilidade em relação ao meu poema...
Triste realidade essa de dar valor a quem o tem...
Beijo
Ártemis