A HERMANN

A HERMANN

Por occasião d'um beneficio a um asylo

    «Conchega a mãi ao peito o filho caro;
    Estende a pomba as azas no seu ninho
          Pelos filhinhos seus.
    Embala o arbusto agreste; o fructo amaro.
    Guia a bussola o nauta em seu caminho,
          Como um dedo de Deus.

    «Bebe a nuvem no mar, no rio a fera;
    Acha o tigre covil na antiga Hyrcania,
          Hoje em dia, Ghilã;
    Renasce a planta á luz da primavera,
    E no calix da flôr gotta espontanea
          Cahe á luz da manhã.

    «Só eu no mundo um gosto em vão pretendo:
    Guebro entre os persas, entre os indios pária,
          Judeu entre christãos,
    Só eu debalde ao céo as mãos estendo,
    Como o naufrago á praia solitaria
          Debalde estende as mãos.

    «Tenho no livro azul onde Elle escreve
    Esse nome, que nunca pronuncia
          Quem bem o soletrou,
    Mil vezes tenho lido que não deve
    Queixar-se mais que a flôr que vive um dia
          Um verme como eu sou.

    «Porém, chorando, as mágoas diminuem.
    Custa muito soffrer sem que um gemido
          Ah! solte a nossa dôr.
    E se aos olhos as lagrimas affluem,
    É que este allivio nosso é permittido.
          O céo orvalha a flor.»

    Diz isto o orphão. De alma os ais lhe sahem,
    Como os suspiros de harpa eolea em ermo.
          Ninguem no mundo o ouviu.
    Mas, se a teus pés as lagrimas lhe cahem,
    Tocou a mão de Christo a mão do enfermo;
          O Lazaro surgiu.

    Por isso, Hermann! espantas-me. Não scismo
    Nos prodigios da milagrosa vara
          Que o Senhor Deus te deu.
    Teu coração, Moysés do christianismo!
    Tua alma é que eu admiro, e te invejára
          Se o que é teu... fosse teu.

Coimbra.

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