MELODIA CONFIDENCIAL (De Albert Samain)

_A L.C._

      Num andamento
      Discreto, lento,
Mal se ouve o pêndulo lavrado e antigo.

      Vamos vogando
      No lago brando
E sem limites do silencio amigo...

      O ultimo e cavo
      Accorde do cravo
Ficou vibrando exclamativamente.

      E, em espiral
      Ascencional,
Cingiu-nos num abraço enlanguescente.

      Na alcatifa macia
      Entrou na agonia
Uma rosa sedenta e abandonada,

      E a ambos nos invade
      A mistica vontade
D'entrar na morte, no não ser, no nada...

      Com seu docel vermelho
      Forrado d'oiro velho,
Que evoca velhas eras d'esplendor,

      O leito pesado,
      Como um deus concentrado,
Remembra obscuramente o nosso amor...

      Na atmosphera morna
      O teu corpo entorna
Um perfume subtil, sensual, complexo,

      Aroma inapagavel,
      Philtro informulavel
Gerado á chama clara do teu sexo.

      Teus olhos silentes
      E transparentes
Teem, no fundo, verdes melancolicos,

      E as brazas do fogão,
      Já quasi extinctas, dão
Clarões hypnotisantes e symbolicos...

      Amêmo-nos assim
      Com um amor sem fim,
Verdadeiro na carne e nas ideias;

      P'los dedos enlaçados
      Sejamos penetrados
D'amor, até ás mais miudinhas veias.

      Em extasis intensos
      Quedemo-nos suspensos
Por sobre a terra ironica e brutal

      Sem nada saber,
      Sem nada ver,
--Numa vida isolada e musical...

      Não fales. Não?
      Ou se o fizer's, então
Que seja de vagar, muito baixinho,

      Numa toada, leve
      Como o halito breve
Duns labios d'anjo numa pel' d'arminho...

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