O QUE EU SINTO...

      Se vejo com pavor as luctas carniceiras
      Que empenham as nações, chamadas as primeiras,
                  Nos campos da batalha,
      Ah! quando a sós comigo e o Eterno me concentro,
      Ouço não sei que voz a mim bradar cá dentro:
                  ==É Deus que ali trabalha==!

      Por mais que ousado vôo aos ceus a aguia eleve,
      Nos ceus ha um limite além do qual em breve
                  Fallece a aza e taes
      Como as aguias os reis!... Subiram, mas solemne.
      O dia ha de chegar em que Deus os condemne
                  E brade-lhes==Não mais==!

      No chão não ha raiz que diga á Terra==estanca
      A seiva que me dás==! Nem aguia ou pomba branca
                  Que engeite o vôo alado!...
      Não ha um lavrador que entaipe em cal e pedra
      A fonte de chrystal, de cujas aguas medra
                  A arvore, a flor, o prado!...

      E onde ha no mundo um povo a outro povo extranho?!...
      Ou odio figadal, intrinseco, tamanho
                  Que a todos nos divida?!
      Se a Terra, o mar profundo e o proprio sol são pouco
      Por darem vida a um lyrio: haverá hoje um louco
                  D'um Cezar que decida,

      D'encontro ás sabias leis por Deus dadas ao mundo,
      Que um homem, cujo peito infinito e profundo
                  Abrange a Terra e os Ceus,
      Guerreie o proprio irmão que é d'elle a propria essencia,
      A luz, o ar, a vida, a força, a providencia,
                  Que deste-lhe, meu Deus?!

      Oh não!... Tu mandarás o dia em que a Justiça
      Obrigue-os a expiar com fronte submissa
                  Dos crimes o estendal
      Que encheu de sangue e horror as paginas da Historia,
      Servindo de lição, ficando por memoria,
                  Em prol do teu Ideal!...

      E o mundo hade voltar á fonte d'onde veio,
      E ser todo elle amor, justiça e paz!... Já leio
                  Signaes _de nova Luz_!...
      As crenças do Passado estando já em terra,
      Vem prestes a surgir a nova Lei que encerra
                  Os sonhos de Jesus!...

      E eu beijo e adoro a mão que impelle e rege o mundo,
      Que deu a flor ao campo; os sóes ao firmamento,
                  E o espirito divino
      Aos nossos corações! Que a toda a creatura,
      Á flor que desabrocha, ao astro que fulgura,
                  A todos deu destino!

      Por isso eu n'este mar, sobre este chão d'abrolhos,
      Por onde cae amaro o pranto dos meus olhos,
                  De fito no Senhor,
      De fito no Ideal, minha alma não se inquieta:
      Confia e sobe a Deus, é como a borboleta
                  Que vae poisar na flor!

Bussaco, 1870.

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