Ouvem-se os sinos da aldeia

Já cá está... mais um! Já cá está... mais um!... Já cá está... mais um!!!!
Ninguém deve cruzar as pernas enquanto o sino bate a funeral!
E neste compasso metálico, repetitivo que fere as entranhas, passos lentos transportam a urna à ultima morada. Logo atras a família, reino do preto, olhos postos no chão, revivem memórias com a força ainda capaz dos corpos fragilizados, gastos no acompanhamento ininterrupto ao morto, na tentativa vã de inverter o fim. Tentam, avidamente, absorver todas as recordações que desejam perpetuar.
Na rua branca da aldeia as portas abrem-se timidamente e a eterna pergunta de medo: Quem morreu? A resposta murmurada, direta, por esta ordem: Foi o, o filho de, irmão de, que morava em, aquele que trabalhou para e rematada com o era boa pessoa... coitado. Tanto que penaram no tempo da miséria. Num gesto quase indecifrável desenham a cruz de Cristo junto à face rugada.
Nesta procissão de silêncios, pensamentos acompanham os corpos vergados, de olhos postos no chão e de vez em quando no caixão, à verdade cada vez mais próxima do qualquer dia...
E os velhos deste povo, vão caindo um a um, sem nada para contar.
Lavam-se as mãos depois de um funeral e não se entra em casa de ninguém. Nesta agua de pureza irão historias de vida, atrocidades vencidas, lições por partilhar.
Restam as casas vazias, caladas, demasiado caladas.
No dia seguinte, os restos da família reequilibram-se no espaço por preencher e os outros, os que acompanham o funeral seguem o destino na esperança do próximo não ser o seu.

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