PRESENTIMENTO

    Emilia! não vês a lua
    Como vacilla e fluctua,
    Ora avança, ora recúa,
    E não ha passar d'alli?
    Tu és a imagem d'ella;
    És tão sympathica e bella,
    Meiga e timida, que ao vêl-a
    Me lembra sempre de ti!

    Tu és o botão de rosa
    Que abraçado á mãi formosa
    Só folga, só vive e goza
    N'aquella triste união;
    Treme até de ouvir a aragem
    Passar por entre a folhagem:
    Emilia! tu és a imagem
    Do mais timido botão.

    Mas embora: o tempo gira.
    Um dia o botão, que aspira
    O ar da manhã... suspira
    E levanta o collo ao céo:
    Vê vir raiando a aurora,
    Abre o seio á luz que adora,
    Correm-lhe as lagrimas, chora...
    Chora o tempo que perdeu!

    Porque elle, Emilia! não teme
    Que a luz da aurora o queime;
    Elle suspira, elle geme
    Por vêr a luz que o creou.
    Nem tambem a lua pára:
    Se algumas vezes repara
    N'uma nuvem menos clara,
    É um momento e... passou.

    Não ha existencia alguma
    Que não tenha amor; nenhuma;
    Porque o amor é, em summa,
    Essencia de todo o sêr.
    Ha sempre quem nos attráia.
    Mil vezes que a onda cáia,
    Ha uma rocha, uma praia
    Aonde a onda vai ter.

    Tu andas já presentida
    D'essa voz que te convida
    A encetar n'esta vida
    Ai! uma vida melhor...
    E em breve desenganada
    D'essa existencia isolada,
    Darás n'alma franca entrada
    A sentimentos de amor!

Silves.

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