RESPONSO
Autor: Cesário Verde on Saturday, 5 January 2013
I N'um castello deserto e solitario, Toda de preto, ás horas silenciosas, Envolve-se nas pregas d'um sudario E chora como as grandes criminosas. Podesse eu ser o lenço de Bruxellas Em que ella esconde as lagrimas singellas. II E loura como as doces escocezas, D'uma belleza ideal, quasi indecisa; Circumda-se de luto e de tristezas E excede a melancolica Artemisa. Fosse eu os seus vestidos afogados E havia de escutar-lhe os seus peccados. III Alta noite, os planetas argentados Deslisam um olhar macio e vago Nos seus olhos de pranto marejados E nas aguas mansissimas do lago Podesse eu ser a lua, a lua terna, E faria que a noite fosse eterna. IV E os abutres e os corvos fazem giros De roda das ameias e dos pégos, E nas salas resoam uns suspiros Dolentes como as supplicas dos cegos. Fosse eu aquellas aves de pilhagem E cercara-lhe a fronte, em homenagem. V E ella vaga nas praias rumorosas, Triste como as rainhas desthronadas, A contemplar as gondolas airosas, Que passam, a giorno illuminadas. Podesse eu ser o rude gondoleiro E alli é que fizera o meu cruzeiro. VI De dia, entre os veludos e entre as sedas, Murmurando palavras afflictivas, Vagueia nas umbrosas alamedas E acarinha, de leve, as sensitivas. Fosse eu aquellas arvores frondosas E prendera-lhe as roupas vaporosas. VII Ou domina, a rezar, no pavimento Da capella onde outr'ora se ouviu missa, A musica dulcissima do vento E o sussuro do mar, que s'espreguiça. Podesse eu ser o mar e os meus desejos Eram ir borrifar-lhe os pés, com beijos. VIII E ás horas do crepusculo saudosas, Nos parques com tapetes cultivados, Quando ella passa curvam-se amorosas As estatuas dos seus antepassados. Fosse eu tambem granito e a minha vida Era vêl-a a chorar arrependida. IX No palacio isolado como um monge, Erram as velhas almas dos precítos, E nas noites de inverno ouvem-se ao longe Os lamentos dos naufragos afflictos. Podesse eu ter tambem uma procella E as lentas agonias ao pé d'ella! X E ás lages, no silencio dos mosteiros, Ella conta o seu drama negregado, E o vasto carmesim dos resposteiros Ondula como um mar ensanguentado. Fossem aquellas mil tapeçarias Nossas mortalhas quentes e sombrias. XI E assim passa, chorando, as noites bellas, Sonhando nos tristes sonhos doloridos, E a reflectir nas gothicas janellas As estrellas dos ceus desconhecidos. Podesse eu ir sonhar tambem comtigo E ter as mesmas pedras no jazigo! XII Mergulha-se em angustias lacrimosas Nos ermos d'um castello abandonado, E as proximas florestas tenebrosas Repercutem um choro amargurado. Unissemos, nós dois, as nossas covas, Ó doce castellã das minhas trovas!
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