*NA FOLHA D'UM LIVRO*
Autor: Gomes Leal on Monday, 21 January 2013Uma é a forma ideal do triste anjo vencido,
--A outra, a doce luz diaphana da manhã!
E entre ellas chora e diz meu coração perdido:
--Em mim vencerá Deus, ou ganhará Satan!?
Uma é a forma ideal do triste anjo vencido,
--A outra, a doce luz diaphana da manhã!
E entre ellas chora e diz meu coração perdido:
--Em mim vencerá Deus, ou ganhará Satan!?
Ninguem soletra mais vossos mysterios
Grandes letras da Noute! sem cessar...
Ó tecidos de luz! rios ethereos,
Olhos _azues_ que amolleceis o Mar!...
O que fazeis dispersas pelo ar?!...
E ha que tempos ha já, fogos siderios,
Que ides assim como uns brandões funereos
Que levaes o Deus Padre a sepultar?!
Ha que tempos, dizei!--Ha muitos annos?...
E, com tudo, astros santos, deshumanos,
A vossa luz é sempre clara e egual!
Escrito em 4-3-1914.
Quem me dera que a minha vida fosse um carro de bois
Ó meus queridos! Ó meus S.tos limoeiros!
Ó bons e simples padroeiros!
Santos da minha muita devoção!
Padres choupos! ó castanheiros!
Basta de livros, basta de livreiros!
Sinto-me farto de civilisação!
Rezae por mim, ó minhas boas freiras
Rezae por mim escuras oliveiras
De Coimbra, em S.to Antonio de Olivaes:
Tornae-me simples como eu era d'antes,
Sol de Junho queima as minhas estantes
Poupa-me a _Biblia_, Anthero... e pouco mais!
No ar calado e bom da camara fechada,
Como um ninho d'amor, casto e silencioso,
Um grande cravo branco ergue o caule cheiroso,
N'uma jarra de jaspe, antiga e cinzelada.
Voam aromas bons no ar tranquillo e molle;
Algumas flores vão morrer nas jarras finas,
--Elle sereno vê, nas rendas das cortinas,
Silencioso morrer na sua gloria o Sol!
Todas morrem ao pé, só elle altivo é bello,
No seu vaso de jaspe, entre as demais existe,
--Como um rei infeliz n'um ultimo castello,
Com seu ar virginal e com seu modo triste!
Um choque de estrelas.
Uma explosão.
Ninguém ferido..
Oh! que harmonia!
Cadente s'esvoaça pela fresta
D'um visinho postigo!
(Hostia d'ouro)
Não sei que ha que me impelle
Para o teu escuro olhar!...
É mais branca a tua pelle,
Do que o linho de fiar!
É tua boca um botão,
E o teu riso a lua nova;--
Quem me dera ter na cova
Os _ais_ do teu coração!
Mal podes saber o gosto
Que tive da vez primeira
Que te avistei, ao sol posto,
Debaixo d'esta amoreira!