Geral

Archanjo vae-te embora

Archanjo vae-te embora: é tarde: em nossas casas
Talvez alguem se afflija; é tão deserta a rua!...
Tu deves sentir frio! Embuça-te nas asas;
Dá saudades á lua.

Um beijo em cada estrella!... Espera que eu sou louco!
Sonhei devo pagar: perdão anjo dos céos!
Agora tem cuidado; o céo escorrega um pouco:
Boas noites adeus!

*A VISITA*

Hontem dormia á noute--e, eis que desperto
Sacudido d'um vento agudo e forte,
Como um homem tocado pela Morte,
Ou varrido d'um vento do deserto.

Accordei--era Deus, que de mim perto,
Me dizia: Alma sceptica e sem norte!
É preciso que creias e te importe
Adorar o Deus Uno, Eterno, e Certo!

É preciso que a fé cresça em tua alma
Como no inutil saibro a verde palma,
Verme! filho da Duvida--Eis-me aqui!

A UM NUNO

A UM NUNO

Provando a existencia de Deus a pobres camponezes

    Ora a provar que ha Deus, Nuno! isso é teima:
    Pois ha alguma ovelha no rebanho
    Que não saiba que só a mão suprema
    Creava um animal d'esse tamanho!

*Os Figos Pretos*

--Verdes figueiras soluçantes nos caminhos!
Vós sois odiadas desde os seculos avós:
Em vossos galhos nunca as aves fazem ninhos,
Os noivos fogem de se amar ao pé de vós!

    --Ó verdes figueiras! ó verdes figueiras
        Deixae-o fallar!
    Á vossa sombrinha, nas tardes fagueiras,
        Que bom que é amar!

--O mundo odeia-vos. Ninguem nos quer, vos ama:
Os paes transmittem pelo sangue esse odio aos moços.
No sitio onde medraes, ha quazi sempre lama
E debruçaes-vos sobre abysmos, sobre poços.

_Sahindo por sortes Compadre de huma Senhora da primeira Grandeza_.

Devo pouco á Natureza,
E muito a hum brinco innocente;
Porque elle me faz parente
Da mais distinta Nobreza.
Embora esquiva riqueza
Pretas fortes me não mande;
Qne importa que ha annos ande
Sempre a perder nas menores,
Se nas dos premios maiores
Me sahio o premio grande.

*Aquarella*

      Accorda a sombra tacita do lago,
      Do rouxinol a candida volata;
      A lua em chispas tremulas de prata
      Imprime ao lesto amor um tom presago.

      O vento raro e brando com afago
      O tredo esquife languido arrebata
      E o transporta subtil, como um pirata,
      Dando azas ao terror ignoto, vago.

      Suspira na floresta a morna aragem,
      As 'strellas trocam beijos delirantes,
      Que mais excitam castellã e pagem,

AOS ASTROS!

Quando ergo á noite os olhos scismadores
      Á cupula do ceu, cheia de mundos,
      E perco-me nos páramos profundos
      D'um mar sem fim de tremulos fulgores:

      O ceu, qual templo levantado á Vida,
      Armado de riquissimo thesouro,
      De par em par descerra as portas d'ouro,
      E attrae a si minha alma embevecida!...

      Chovem-me então das cellicas alturas,
      Das luminosas, candidas estrellas,
      Visões sublimes, ideaes e bellas
      Da Causa que deu o ser ás creaturas!...

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