os fardos da existência justificam a náusea que por vezes influi na minha poesia: nos inusitados temas que concebo para desdobrar os meus pensamentos; nas lembranças dolorosas que emergiram da minha primitiva solidão.
dourei a vida com um manifesto de lucidez para obstruir os meus percalços; para expor a farsa introduzida nos atos grandiosos das pessoas; para revelar as máscaras que desacreditam a sua genuinidade.
os poros do tempo
absorvem
-dentro da alma
as cintilantes fagulhas
de nossa ampulheta
interior
que filtra toda a areia
da eternidade
sem contudo, esgota-la!
as palavras cruéis que eu ouvi nas funduras dum querer desfeito... nos lugares escarpados onde plantei a solidão... nos temporais gerados pela minha ousadia... no decoro hipócrita que me rodeou... nas agressões severas que me golpearam...
O pecado me afastou
Eu me lembro, de ter saído numa, quinta ou sexta
Procurando saídas para esta miséria
E foi numa sexta que eu ia, ia num caminho sem volta.
Tanto chorei para conseguir uma megalha de pão
E o diabo apareceu, parecendo dá-me a mão
E no entanto não percebi, e comecei gritar, minha cansola mó, irmão.
compreendo a gente que desiste da própria vida feita de assombros persistentes; feita de canseiras promovidas pelos artifícios do mundo que a rodeia; feita do delicado cristal das suas adversidades.
contesto a penumbra em que vivemos quando nos orientamos pelo mundo vigente e pelos seus esquifes ambulantes; pelas selvas urbanas e pelos seus assombrados dilemas; pelos rogos inúteis que subsistem na alma das pessoas.
suprimo a dor através dos corolários que vou desdobrando na minha poesia; através do ribombar dos sinos da minha liberdade; através da vibração do pensamento dos sábios na minha inteligência.
os meus versos sulcam o mar das reflexões para me livrarem das ondas funestas da paixão; para inibirem o meu pranto derramado na tosca praia dos costumes; para reaverem o meu fôlego nas dunas da utopia.
as coisas supérfluas deslocam para apetites nocivos a nossa liberdade: transvertem os nossos anseios em bagatelas que entorpecem os problemas; as nossas fantasias morrem no campo minado das estéreis precisões.