o cais sereno
Autor: António Tê Santos on Wednesday, 13 December 2017as minhas próteses respingam as suscetibilidades duma vida assoberbada pelas virações que eu transgredi e que agora inspiro sofregamente pelos carris da harmonia.
as minhas próteses respingam as suscetibilidades duma vida assoberbada pelas virações que eu transgredi e que agora inspiro sofregamente pelos carris da harmonia.
Quando você levantou
Já existia um lindo amanhecer
Eu havia preparado O sol
Para o seu dia aquecer
Também o alimento para sua nutrição
Para que continuasse a viver
À noite enquanto dormia
Providenciei tudo pra você
Vigiei e guardei a sua casa
Seu sono e o de sua família
De manhã os pássaros cantaram
Eu esperei pelo seu bom dia
Parecia ter tanta pressa
Das minhas palavras se esquecia
Surgiram às flores, deram o perfume.
A brisa do amanhã lhe fez companhia
O poema roubado
Quem roubou o poema
era também um poeta
poeta que rouba poeta
tem cem poemas de perdão.
O que fazer com o poema roubado
se não pode gritá-lo
aos quatro cantos?
Mas roubou e guardou
como se fosse uma joia
de pedras reluzentes.
Sempre o lia de alma culpada
de desejo improcedente
como se fosse seu
o pensamento alheio.
Amargou por toda vida
o poema roubado
que delicia foi o trato
que teve o poeta com o diabo.
a minha voz entoa preces constrangidas pelos sustentáculos da minha abrangência nos dias turvos que eu fronteei em teatros virulentos (com os extravios empolgados pela minha juvenilidade).
Sem direito
Morreu sem direito a luto
Sem direito a velas
Sem direito a preces
Tudo isto porque morreu
Se vivo estivesse
No luto lutaria
Muitas velas acenderia
E uma prece rezaria
Mas morto está
Na memória de todos
Nas curvas da historia
No voo solitário da gaivota
Não luta mais
Não reza mais
Não voa mais
Mas pode ressuscitar
Dentro de uma garrafa cheia
De aguardente quente
De pensamento fumegante
De futuro insipiente