realço a vida que me descontenta e que me obriga ao isolamento: porque ela imprime na minha alma uma rebeldia que me constrange; porque as suas promessas se dissolvem nos temporais que superei.
as lágrimas que outrora verti correm agora pelos socalcos da poesia: inundam as páginas dos livros que sustentam com vocábulos duradoiros; deslizam pelos corrimões das minhas angústias abrindo as portas a uma sensibilidade fulgente.
existe harmonia nos homens quando eles insuflam no coração uma ternura adjacente às palavras que entoam para lutar contra a sua carência ética; quando eles reforçam a concórdia numa esfera mais alta que o seu destino original.
o vigor da minha razão transparece nos poemas que ofereço aos leitores: nos ditames fecundados pela minha jovialidade; nas máculas sofridas que eu soube entender para depois as dilacerar convictamente.
não me revejo nos exaustivos dilemas das sociedades: nos seus escrúpulos e nos seus palavreados banais; nos seus ritmos veementes em busca de triunfos fugazes; nos seus valores pedantes que geram indubitáveis frustrações.
demando as minhas mágoas para as analisar; para as circunscrever aos desgrenhados horizontes que entrevi; para me afastar dos tempestuosos destinos onde me atolei; para desfazer os cardos espinhosos que nutri.
haja um féretro onde se coloque a malignidade abrangente; os vestígios pérfidos da existência humana; os desvairos emocionais que nos supliciam; as narrativas que mentem para agrilhoarem as nossas utopias.
a fulgência que me ilumina fez-me saltar de poça em poça até à minha redenção; bafejou a minha existência com abundantes pensamentos; protegeu-me dos agravos persistentes; voejou sobre as nuvens das minhas contusões.
desencanta-me a louca correria pelo sucesso e as perturbações que origina: ela enfraquece a solicitude nos baldios da arbitrariedade; e incentiva as proezas disformes daqueles que renunciam ao verbo amar.
endereço palavras lacerantes àqueles que modelam as nossas vidas e a transformam numa correria ribombante; num suplício recheado de próteses e de ferimentos incuráveis; numa realidade que aprofunda o nosso desprotegido viver.