o baú das transfusões
Autor: António Tê Santos on Monday, 13 March 2023os versos que vou redigindo transparecem as náuseas duma vida dissoluta e as feridas duma vida perturbada, mas melhoram o ar que inspiro nas catacumbas dum ócio reabilitado.
os versos que vou redigindo transparecem as náuseas duma vida dissoluta e as feridas duma vida perturbada, mas melhoram o ar que inspiro nas catacumbas dum ócio reabilitado.
escorraço a tristeza para consolidar a minha autonomia; para que a paisagem do desencanto se afaste do meu ânimo; para que a tenacidade do meu pensamento se imponha às fúteis desavenças humanas.
extraio da alma figurações que fragmentam a displicência e o abandono: elas têm prioridade sobre os modelos que me rodeiam e que arrebataram a minha candura; elas extinguem as máculas enrugadas que retiro da misantropia.
possuo a versatilidade do pensador que obliqua pelas intermitências das suas mágoas; que compõe uma poesia que jorra vereditos revoltados; que transporta a sua determinação pelas alamedas infindáveis da sabedoria.
Bebi da fonte dos Clássicos
Embebedei-me com eruditos,
também me curvei perante artistas plásticos
todos eles com esqueletos escondidos.
Entre cancioneiros e portefólios,
alimento as minhas entrenhas.
Vasculho no abismo do meu espólio
as páginas queimadas como lenha.
descrevo a minha intervenção na global monotonia; na estrutura influente e nos seus transtornados dilemas; na transferência da minha poesia para os rochedos do isolamento.
divirto-me quando manifesto as minhas fantasias pueris;quando lembro as minhas transgressões aos valores insípidos do mundanismo; quando respiro o aroma da minha vasta liberdade.
cintilam os vocábulos dos poetas quando são realçados pelos seus desaires emocionais; pelas manigâncias a que não sabem resistir quando empunham o archote da sinceridade; pelas garras fincadas no seu afligido viver.
as palavras fundamentam-me quando restauram os meus sentimentos transviados; quando ampliam a minha coerência para recolherem uma ínfima glória; quando almejam a grandeza de quem escreve poesia.