Arida palma

    Arida palma
    Tem seu licôr,
    Tem como a alma
    Tem seu amor;
    Tem como a hera
    Tem seu abril,
    Tem como a fera
    Tem seu covil.

    Tem toda a planta
    Que o sol queimou
    Lagrima santa
    Que a orvalhou,
    E o passarinho
    Que hontem nasceu
    Lá tem seu ninho
    Que a mãi lhe deu.

*DE NOUTE*

A João de Deus

Elle vinha da neve, dos trabalhos
Violentos, custosos, da enxada;
Cantando a meia voz pelos atalhos.

A mulher loura, infeliz, resignada,
Cosia junto á luz. O rijo vento
Batia contra a porta mal fechada.

Ao pé havia um Christo, um ramo bento,
E uma estampa da Virgem, colorida,
Cheia de magoa olhando o firmamento.

Uma banca de pinho, mal sustida,
Vacillante nos pés, um candieiro;
Companheiros d'aquella negra vida.

*A Poezia do Outomno*

Noitinha. O sol, qual brigue em chammas, morre
Nos longes d'agoa... Ó tardes de novena!
Tardes de sonho em que a poezia escorre
E os bardos, a sonhar, molham a penna!

Ao longe, os rios de agoas prateadas
Por entre os verdes cannaviaes, esguios,
São como estradas liquidas, e as estradas
Ao luar, parecem verdadeiros rios!

Os choupos nus, tremendo, arripiadinhos,
O chale pedem a quem vae passando...
E nos seus leitos nupciaes, os ninhos,
As lavandiscas noivam piando, piando!

Ao Illustrissimo, e Excelentissimo Senhor Marquez de Marialva

_Ao Illustrissimo, e Excelentissimo Senhor Marquez de Marialva, com quem
se tinha encontrado o A. na Caza em que estava o Embaixador de
Marrocos_.

Na Quinta da Praia clama,
Que lhe tireis a Cadeira
Hum triste, que quarta feira
Comvosco esteve em Moirama:
Se a Estrella, que a Vós o chama,
Não lhe abranda os seus destinos,
Torna para os Marroquinos;
Porque, agoiros por agoiros,
Antes cativo de Moiros,
Do que Mestre de Meninos.

*Vae victis*

(_Struggle for life_)

      Rasga sacrilego a amplidão celeste
      Um milhafre com azas pardacentas
      E a cotovia harmoniosa investe
      Armando as garras torpes e cruentas.

      Negro como o lethargo do cypreste,
      Rosna o vento nas franças macillentas,
      O sol dardeja n'um pallor agreste
      Que enthusiasma as nuvens corpolentas.

      A luz crua p'lo espaço se derrama,
      Engrossam os trovões em alcateia,
      Rutila do corisco a alegre flamma.

Ponto final (N'UM ALBUM)

Pediste-me um soneto delicado,
Exquisito, gentil, galanteador,
Feito com versos d'oiro e cravejado
Com rimas de finissimo lavor.

Ora eu, confesso aqui o meu peccado,
Nunca tive feição de trovador,
Acho o lyrismo d'album requintado,
Banal, elogioso, sem valor.

Aqui me tens; jámais falto ás promessas.
Exijo, pois, de ti que não esqueças,
Em troca, filha, este pedido meu:

Que para ennobreceres o soneto,
Venhas fechar o ultimo tercetto
--Com o ponto final d'um beijo teu.

O CAÇADOR FEROZ. (_Burger_).

Sua buzina tocára
  O conde, altivo senhor:
  «De pé, de cavallo, álerta!--
  Disse; e monta o corredor.
O nobre animal relincha:
  Pula e parte; e a turba após.
  Ei-los vão! Quem era o conde?
  Era o _caçador feroz_.
Por estevaes e por sarças,
  Por campinas cultivadas,
  Voam rapidos. Resoam
  Motejos, gritos, risadas.
O sol que vinha rompendo
  Em luz as veigas banhava,
  E do zimborio do templo
  O lanternim scintillava.
«_Tlim, tlão!_--convocando á missa,

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