IMITAÇÃO DO ISLANDEZ
Autor: Soares de Passos on Tuesday, 4 December 2012
20 ANOS DE RESISTÊNCIA
Há 20 anos, eles marcaram indelevelmente a música portuguesa e mostraram a toda uma geração a magia da simplicidade, o poder de uma voz e uma guitarra.
20 Anos depois os Resistência juntam-se de propósito para este concerto único no Campo Pequeno a 19 de Dezembro, devolvendo ao nosso convívio um projecto que estava à frente do seu tempo e que se mantém um marco intemporal da música portuguesa.
Eu venho-vos cantar, mimosas flôres,
A vós irmãs da luz, gentis e bellas,
Do chão que piso vívidas estrellas,
Com mil perfumes, mil viçosas côres!
Á vossa encantadora companhia,
Toda cheia de graça e de candura,
Eu devo em parte a luz serena e pura
Do amor, que meu espirito allumia!...
Cercando-me dos vossos esplendores,
Nos quaes eu pasto dia e noite a vista,
Consigo converter meu lar d'artista
N'um Louvre de riquissimos lavores
Vapores que em vistosos cortinados
Armaes dos ceus o templo de safira
Com purpura e finissimos broxados,
Sêde hoje o assumpto para a vóz da lyra!
Que eu quero ter a intima certeza
Que, antes da hora da fatal partida,
A minha alma no mundo fica preza
Ás coisas bellas que adorei na vida...
Horas felizes que ainda hoje eu passo,
Pelas tardes calmosas do verão,
Seguindo-as uma a uma pelo espaço,
Dizei ás nuvens se eu as amo ou não!...
A. J. Emídio Amaro
Ó minha terra na planície rasa,
Branca de sol e cal e de luar,
Minha terra que nunca viu o mar
Onde tenho o meu pão e a minha casa...
Minha terra de tardes sem uma asa,
Sem um bater de folha... a dormitar...
Meu anel de rubis a flamejar,
Minha terra mourisca a arder em brasa!
Minha terra onde meu irmão nasceu...
Aonde a mãe que eu tive e que morreu,
Foi moça e loira, amou e foi amada...
Eu me ausento de ti, meu pátrio Sado,
Mansa corrente deleitos, amena,
Em cuja praia o nome de Filena
Mil vezes tenho escrito, e mil beijado:
Nunca mais me verás entre o meu gado
Soprando a namorada e branda avena,
A cujo som descias mais serena,
Mais vagarosa para o mar salgado:
Devo enfim manejar por lei da sorte
Cajados não, mortíferos alfanges
Nos campos do colérico Mavorte;
E talvez entre impávidas falanges
Testemunhas farei da minha morte
Remotas margens, que humedece o Ganjes.
Fazer versos delirantes
Ao teu frio coração
É como engastar diamantes
N'um ad'reço de latão;
D'aquelle de quem falo, as socegadas lousas
Podiam-vos contar as violações brutaes!
A gula com que morde as mais sagradas cousas
D'horror faz recuar os trémulos chacaes.
Não descanta á viola, á noite, os seus enleios:
Elle vive na sombra e eu sei também que vós,
Gentis bellezas d'hoje, ó astros dos Passeios,
Lhe não lançaes, a furto, a escada de retroz.
Estou doente. Meus pensamentos começam a estar confusos
Mas o meu corpo, tirado às cousas, entra nelas.
E uma grande libertação começa a fazer-se em mim,
Esta tarde a trovoada caiu
Pelas encostas do céu abaixo
Como um pedregulho enorme...