*No Passeio Publico*

      A charanga transuda uma _gavotte_:
      Dois caturras discutem acirrados,
      E com bengalas corneas d'estoque
      Vibram politica em medonhos brados;

      Um coronel solemne, um D. Quichotte
      Exige a continencia d'uns soldados,
      E trauteando a polka da Mascotte
      Giram damas a passos alquebrados;

      As _lorettes_ com artes de raposa
      Perseguem os alferes; conjecturo
      Que não seja talvez p'ra boa cousa.

Vaga, no Azul Amplo Solta

Vaga, no azul amplo solta,
Vai uma nuvem errando.
O meu passado não volta.
Não é o que estou chorando.

O que choro é diferente.
Entra mais na alma da alma.
Mas como, no céu sem gente,
A nuvem flutua calma.

E isto lembra uma tristeza
E a lembrança é que entristece,
Dou à saudade a riqueza
De emoção que a hora tece.

Jurando de não Mais em Outra Ver-me

Como quando do mar tempestuoso
O marinheiro todo trabalhado,
De um naufrágio cruel saindo a nado,
Só de ouvir falar nele está medroso;

Firme jura que o vê-lo bonançoso
Do seu lar o não tire sossegado;
Mas esquecido já do horror passado,
Dele a fiar se torna cobiçoso;

Assi, Senhora, eu que da tormenta
De vossa vista fujo, por salvar-me,
Jurando de não mais em outra ver-me;

Com a alma que de vós nunca se ausenta,
Me torno, por cobiça de ganhar-me,
Onde estive tão perto de perder-me.

És dos Céus o Composto Mais Brilhante

Marília, nos teus olhos buliçosos
Os Amores gentis seu facho acendem;
A teus lábios, voando, os ares fendem
Terníssimos desejos sequiosos.

Teus cabelos subtis e luminosos
Mil vistas cegam, mil vontades prendem;
E em arte aos de Minerva se não rendem
Teus alvos, curtos dedos melindrosos.

Reside em teus costumes a candura,
Mora a firmeza no teu peito amante,
A razão com teus risos se mistura.

Tibio o sol entre as nuvens do occidente

Tibio o sol entre as nuvens do occidente,
Já lá se inclina ao mar. Grave e solemne
Vai a hora da tarde!--O oeste passa
Mudo nos troncos da alameda antiga,
Que á voz da primavera os gomos brota:
O oeste passa mudo, e cruza o atrio
Ponteagudo do templo, edificado
Por mãos duras de avós, em monumento
De uma herança de fé, que nos legaram,
A nós seus netos, homens de alto esforço,
Que nos rimos da herança, e que insultamos
A cruz e o templo e a crença de outras eras;
Nós, homens fortes, servos de tyrannos,

CONSCIENCIA

      Para um homem que aspira
      Ao ideal da Belleza,
      Não ha maior tristeza,
      Magua maior não ha,
      Que vêr escurecer-se-lhe
      O ceu da noite escura
      D'alguma ideia impura,
      D'alguma paixão má!

      Paixão que muitas vezes
      A luz da nossa Ideia
      Accende, inflama, atêa,
      E depois nos attrae
      Com tanto magnetismo,
      Com tal encantamento,
      Que o homem n'um momento
      Vacilla, cega e cae!...

HYMNO AO SOL

Vous prêtres! qui murmurez, vous portez ses signes sur tout votre
     corps: «votre tonsure» est le disque du «soleil,» votre «étole» est
     son zodiaque, vos «chapelets» sont l'embléme des astres et des
     planétes.

     VOLNEY (LES RUINES)

Eu poucas vezes canto os casos melancolicos...

Eu poucas vezes canto os casos melancolicos,
Os lethargos gentis, os extasis bucolicos
E as desditas crueis do proprio coração;
Mas não celebro o vicio e odeio o desalinho
Da muza sem pudor que mostra no caminho
A liga á multidão.

A sagrada poesia, a peregrina eterna,
Ouvi dizer que soffre uma affecção moderna,
Uns fastios sem nome, uns tedios ideaes;
Que ensaia, presumida, o gesto romanesco
E, vaidosa de si, no collo eburneo e fresco,
Põe crémes triviaes!

Pages