Cada um tem os seus monstros
Autor: JNicolau on Saturday, 2 April 2022
O escritor caído em desgraça corre
Sobre o papel como se fosse atleta,
Falha na intensão, a inspiração morre,
O escritor caído em desgraça corre
Sobre o papel como se fosse atleta,
Falha na intensão, a inspiração morre,
No dicionário de quem conta
O sucesso é sinónimo de escrita,
O difícil de se fazer poesia
É ser tudo fácil em excesso,
Que antes de ser já existia
Em mim, juro e confesso.
Existe onde penso e sinto,
Aparece no papel escrito,
Como mapa dum labirinto
Innito que parece finito.
Sou assim e deixo-me cair
Nesta tentação que tenho,
A loucura que há por sentir
A arquitetura do engenho.
Por isso escrevo este relevo
Que tenho na alma exposto,
Faço o que posso e que devo
Na fotografia do meu rosto.
Os escritores são iguais a toda a gente,
Têm uma profissão como tantas pessoas,
Ser escritor tem que ver com ser diferente,
Ou, pelo menos, ser viajante nas proas.
Poetas que escrevem fazem alexandrinos,
Fazem a métrica toda, se for preciso,
Com tantas personagens, com mais figurinos,
E a conclusão do verso é sempre um paraíso.
Escrever livros? É muito fácil fazê-lo.
Pode fazê-lo qualquer pessoa, e pronto.
Às vezes, fazem loucos, puxam o cabelo,
E nunca nada finaliza com um ponto.
O pensamento se perde pela linguagem
As sentenças mais joviais apodrecem
É como a passagem da infância
Para a feição adulta da vigilância:
Olhando todo o detalhe ligeiro.
É racional, mas esquece o primeiro
Sentimento puro do momento.
Enunciados são caixões da verdade,
Palavras, catacumbas da triste saudade.
Maquinário das emoções,
Sob domínio de seu engenho,
Ele dá passo a passo
A cerimônia de suas afeições.
Liturgicamente célebre em controle,
Em ritual sem deidades e padres;
Blasfemando contra sua natureza:
Cérberos latem contra a alma.
Não sente nada que não deseja,
A não ser a mordida da vontade
Que pereça: rasga suas veias
Porque não suporta sentir.
A cada ocorrido fúnebre,
Minha sombra clareia a escuridão
As luzes do palco focam em mim
O show do palhaço mentiroso
Por baixos dos panos está a verdade
Literalmente atrás das cortinas
O malfeitor de todos guerreiros.
Não tente decifrar este enigma
O aparato cognitivo te impede
A sensibilidade está acima da razão
Quem é o palhaço? Qual é a verdade?
Minhas ideias são caixas de metonímias:
Secretamente fechadas em paradoxos
De metáforas indulgentes.
Nossa arte morreu faz tempo
O que sobrou são restos de desalento
Olho um quadro abstrato e vejo vômito
Regurgito o material do quadro insólito
Minha náusea faz parte da obra moderna
A barriga está fria, é a vontade que não se alterna
Excrementos da feiura compõe natureza-morta
A pífia subversão da beleza-morta
Deixaram no caixão velho uma mentira intelectual
Ou talvez eu seja apedeuta e não veja o novo normal?