Pudica

A nudez impudíca

dessa parede branca

não me deixa esquecer

do mal que me abocanha.

 

Antes da outra,

já sinto a morte

de saber inúteis os planos

e impossíveis os sonhos.

 

Senhora da única certeza

e o fim das possibilidades,

sinto-a represar o rio

que naveguei.

 

Em que porto, aportarei?

O moinho

Corpo redondo, olhos pequeninos,
no cume da serra de braço a girar
ao sabor do vento, cantando hinos,
sem preguiça... sempre a trabalhar.

Lado a lado com o seu amigo,
elabora a farinha e canta crente,
ser capaz de fazer de um grão de trigo
o fim da fome que mata tanta gente.

Assim passa a noite o redondo moinho,
dando guarida ao moleiro, que sozinho,
luta na noite ora a trabalhar, ora a vigiar

Ai

Como se encostar à parede
não saber da espada
e eu gostasse
Como se perdidos por um
sem caber mil
e eu gostasse
Como se mudassem os tempos
ganhando vontades
e eu gostasse
Como se quem vê caras
sente coração
e eu gostasse
Como se...
quase, quase
em aflição...

Bússola

Abstenho
Mas depois, ao navegar do tempo
Perco
Mas depois, ao sabor do vento
Canso
Mas depois, ao rumo do leme
Molho
Mas depois, na liberdade da chuva
Entristeço
Mas depois, no ilimite do olhar
Vagueio
Mas depois, no divagar do pensamento

Mas depois...
Essa bússola enfeitada de nós

Tinha tudo.

Sugeriu-lhe um charuto. Acendeu-o sugando o seu suco seco. Refastelou-se no cadeirão olhando os montes, depois, o prado à sua frente. Estava verde. A aragem misturava-se com o charuto. Foi ali naquele lugar que quis voltar a viver. Relembrou. Já fora tempos em que galgava aqueles montes na liberdade de criança e na leveza do corpo. Tudo podia e sentia-se capaz. Os pés descalços que tocavam a erva em velocidade veloz. Ah... sabia-lhe bem. Olhou seu abdomen proeminente, sentiu-se pesado. O reumático não ajudava e aos oitenta anos desistiu de o combater. Relembrou os dias felizes.

O gato

Era um gato empertigado, senhor do seu nariz. Grande e gordo.

Outrora fora ágil mas parecia não dar pela mudança, a não ser nas suas costumeiras e longas ausências em que deambulava por onde lhe apetecesse. Aí apercebia-se que as gatas do bairro e até de outros arrabaldes eram mais selectivas. Queriam gatões elegantes transbordantes em feromonas de prazer activo.

DA VIDA QUE MORRE NO SEIO DO AMOR

O sol que brilha no céu

Me cega no mar

Além do horizonte

 

Na vida que morre no seio do amor

 

O mar com seu negro véu

De luz estrelar

Perdida na fonte

 

Da vida que morre no seio do amor

 

A luz que força a passagem

Viola o teu olho

Buscando ali ver

 

A vida que morre no seio do amor

 

O olho que cria a miragem

Que eu mesmo escolho

Buscando entender

 

A vida que morre no seio do amor

 

E escolho por mera ambição

Como se...

Como se Júpiter se juntasse a Saturno. E a lua não fosse para se sonhar... Como se os rios se juntassem aos mares. E as margens não fossem para se passar...
Como se o vermelho se juntasse ao amarelo. E o laranja não fosse para se pintar...
Como se o saborear se juntasse ao paladar. E o fruto não fosse para se provar...
Como se o fogo se juntasse ao ar. E a água não fosse para se apagar...
Como se as horas se juntassem aos dias. E o tempo não fosse para se dar... Como se a gravidade se juntasse ao levitar. E a terra não fosse para se assentar...

Pintura estragada !

    Pintura estragada !

 

Minha mente pintou um quadro lindo !

Pleno de flores e meninos rindo

E searas loiras bailando ao vento !

Num canto ermo, ouve-se um lamento !...

 

Pintei estrelas vivas, a piscar.

O pó de um cometa , o céu a riscar.

Luar prateado a iluminar !

Numa casa fria...alguém a chrorar !...

 

Minhas pinturas tão bem inspiradas

Onde celebro a beleza de Maio,

Por que surgem nelas cenas magoadas !?

 

Hei-de esboçar e criar com paixão

O que vai nem sempre volta

"O que vai nem sempre volta"
Entre sombras e recordações procuro o que ficou para trás,
Sonhos e esperanças que já lá vão neste rumo de um embarcar ,
o tempo vai contando de uma maneira tão eficaz,
tal como o Reiniciar de um relógio contando a esperança que te faz acreditar.

Ficou marcado como tatuagem aquela imagem,
momentos vagos mas tão sólidos presente na saudade,
tal como um renascer numa palavra em tom de liberdade,
discrição e um significado invade este sonho numa viagem.

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