Bela Entorpecida
Autor: Renato Laia on Thursday, 9 January 2014Eu podia dormir
para sempre,
E só acordar
de vez em quando,
Para assim ter
o prazer
da consciência
de estar dormindo.
Eu podia dormir
para sempre,
E só acordar
de vez em quando,
Para assim ter
o prazer
da consciência
de estar dormindo.
O Amor rói-me por dentro,
Corrompe-me a seriedade.
Dou por mim obsessivo
E um tanto compulsivo,
Embeiçado em tal simplicidade
Que perco a noção da realidade.
Mas calo-me.
Calo-me e não me revelo.
Guardo todos esses segredos para mim,
Esperando, estupidamente, o outro alguém.
Aguardando que esse alguém tome a iniciativa
Que eu nunca sou capaz de tomar.
E não é por falta de sentimento que não o faço,
Isso é certo!
Fumo a vida na ponta de um cigarro,
sorvendo delicadamente a nicotina
que me embala os sentidos.
Não espero nada.
No Príncipe Real reina a tranquilidade costumeira:
Os pássaros voam por sobre a minha cabeça,
passando rentes aos meus pensamentos
que se elevam altos no ar.
Jogam-se baralhos de cartas reformados
enquanto se discute a sueca da crise actual.
Os pombos debicam as migalhas
que algum sénior despojou pelo chão
como que a queimar os últimos cartuchos que lhe restam.
Há certas músicas que têm
o condão de me arrancar
do peito o coração onírico
e de o fazer esvoaçar pelo ar,
dependurado nas semínimas
e colcheias dessas tais melodias,
de o fazer subir como um balão de ar quente
a dançar por entre nuvens etéreas,
feitas do algodão mais fino e macio,
feitas do algodão mais doce.
E nessas nuvens, que se constituem
como as almofadas dos meus sonhos
onde recosto a cabeça,
fantasio risos em verdes prados...
E eu pasmo-me assim,
Quero estar sozinho!
Por favor, deixem-me estar sozinho...
Mais sozinho do que o que já sou!
Deixem o isolamento comer-me vivo,
Encolhido com os meus desalentos,
Retirado da mundana hipocrisia!
Não consigo suportar mais a convivência,
Nem posso permitir-me ter mais conivência,
Com aqueles que me querem por conveniência.
Não! Não é isto que realmente anseio!
Sou mentiroso e não sei bem o que quero,
Não consigo expor em frases o que sinto...
Devo ter começado a morrer numa qualquer tarde de melancolia estival,
Da qual me lembro agora por já a haver esquecido nos meandros da memória...
Quando foi que deixei de ser Eu para me tornar nisto que sou?
Nesta coisa amorfa e sem ânimo, nesta viscosidade apática?
Não me consigo lembrar de quando tudo começou a acabar...
Sei que agora vai acabando, lentamente, sumindo-se como areia por entre os dedos!
É tão estranha esta sensação de me olhar ao espelho e não mais me reconhecer,
Venho aqui despir-me e banhar-me em ti,
entre o Sol da noite e a luz do amanhecer.
Devora-me se puderes,
devora a minha urgência de transformante de tudo em nada,
ser o não ser do ser desejo em atmosfera inflamável.
Respira-me o ar inteiro da paixão até nada,
apenas vapor da pele,
rasga-me o recatado beijo de lábios,
em quatro lábios na partitura da ânsia,
verte-me em pedra húmida até á margem
do remanso afecto.
Corpo de texto vadio em espírito leve,
memória incessante da vagabundagem dos pensamentos,
onde o sangue queima a veia do poema.
Quanta vadiagem cifra os sonhos quentes dos Amantes,
quanta nudez toma a liberdade de ti,
quantas paixões navegam aqui,
digo-te hoje que o desejo vagueia no vazio
da onda fantasma da ilusão.
São rasgões estranhos entre o temor e o espanto,
suturados de Amor na respiração anfíbia da Aurora,
A poesia faz eco na floresta do meu sentir,
por um segundo parece-me que outras vozes
do meu sentir clamam e teimam silenciar esta inquietude,
minha mente inquieta é muro denso ao chamamento.
Mais uma mancha de metáforas invadem o meu poema,
o mar de Amor que sempre desejei parir,
nasce aqui em papel branco de mim,
Onde a mente inquieta
navega nas sílabas do verbo Amar.
Foste tu, mente inquieta,
Abraham Lincoln (1809-1865)