*O BUDA*

(De Catullo Mendés)

O Budha scisma, as mãos sobre os artelhos.

Aquelle então que ouvira os seus conselhos
Diz:--Mestre! os que não foram resgatados
Do Mal, são como uns ceus anuviados!
Aos povos que d'aqui moram distantes,
Para que a Lei não errem, ignorantes,
Consente que affrontando os soes e os frios,
Montes, rochas, passando a nado os rios,
Teu grande dogma, ó Mestre, eu vá prégando!...

--Mas se elles, corta o Budha venerando,
Te insultarem, eleito! que dirás?

Sê Altivo!

Altos pinheiros septuagenarios
E ainda empertigados sobre a serra!
Sois os Enviados-extraordinarios,
Embaixadores d'El-Rey Pan, na Terra.

A noite, sob aquelles lampadarios,
Conferenciaes com elle... Ha paz? Ha guerra?
E tomam notas vossos secretarios,
Que o _Livro Verde_ secular encerra.

Hirtos e altos, Tayllerands dos montes!
Tendes a linha, não vergaes as frontes
Na exigencia da côrte, ou beija-mão!

A Máscara

Contempla esse perfil de graças florentinas;
Na sóbria ondulação do corpo musculoso
Excedem Força e Proporção, irmãs divinas.
Essa mulher, fração de um ser miraculoso,
Divinamente forte, amavelmente pobre,
Criada foi para no leito arder em gozo,
Saciando os ócios de um pontífice ou de um nobre.

LYRA XX.

Em huma frondosa
Roseira se abria
Hum negro botão.
Marilia adorada
O pê lhe torcia
Com a branca mão.

  Nas folhas viçosas
Á abelha inraivada
O corpo escondêo.
Tocou-lhe Marilia,
Na mão descuidada
A fera mordêo.

  A penas lhe morde,
Marilia gritando,
C'o dedo fugio.
Amor, que nos bosques
Estava brincando,
Aos ais acudio.

Que Vençais no Oriente tantos Reis

Que vençais no Oriente tantos Reis,
Que de novo nos deis da Índia o Estado,
Que escureçais a fama que hão ganhado
Aqueles que a ganharam de infiéis;

Que vencidas tenhais da morte as leis,
E que vencêsseis tudo, enfim, armado,
Mais é vencer na Pátria, desarmado,
Os monstros e as Quimeras que venceis.

Sobre vencerdes, pois, tanto inimigo,
E por armas fazer que sem segundo
No mundo o vosso nome ouvido seja;

Junquilhos

Nessa tarde mimosa de saudade
Em que eu te vi partir, ó meu amor,
Levaste-me a minh'alma apaixonada
Nas folhas perfumadas duma flor.

E como a alma, dessa florzita,
Que é minha, por ti palpita amante!
Oh alma doce, pequenina e branca,
Conserva o teu perfume estonteante!

Quando fores velha, emurchecida e triste,
Recorda ao meu amor, com teu perfume
A paixão que deixou e qu'inda existe...

Estátua Falsa

Só de ouro falso os meus olhos se douram;
Sou esfinge sem mistério no poente.
A tristeza das coisas que não foram
Na minha'alma desceu veladamente.

Na minha dor quebram-se espadas de ânsia,
Gomos de luz em treva se misturam.
As sombras que eu dimano não perduram,
Como Ontem, para mim, Hoje é distancia.

Já não estremeço em face do segredo;
Nada me aloira já, nada me aterra:
A vida corre sobre mim em guerra,
E nem sequer um arrepio de mêdo!

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