Tradução
Autor: elson mesquita ... on Monday, 31 December 2012Traduzir, traduzir-se;
Traduzir, traduzir-se;
_A Cassianno Neves_
Bocca talhada em milagrosas linhas,
A luz augmenta com o seu falar.
Esta manhã um bando de andorinhas
Ia-se embora, atravessava o mar.
Chegou-lhes ás alturas, pela aragem,
Um adeus suave que ella lhes dissera,
--E suspenderam todas a viagem,
Julgando que voltára a primavera...
Como a agua em funda gruta
Gotta a gotta filtra e cái,
Sem saber quem isso escuta
O que lá por dentro vai:
Como ao longe incerta e baça
N'uma igreja alveja a luz,
Que da lampada esvoaça
E a vidraça reproduz:
Mal te vi, moira encantada!
Mas á luz dos olhos teus
Murcha a lampada sagrada
D'um altar do nosso Deus.
Mal te ouvi, mas as suaves
Melodias, que te ouvi,
São mais dôces que as das aves
Da aldêa onde nasci!
A Batalha Reis
FAUSTO E MEPHISTOPHELES
FAUSTO
Nas noutes brancas de lua
É que se abrem as janellas!
Vem vêr meus olhos escuros
A sementeira d'estrellas!
Quem me dera a mim que fosse
Para te poder fallar,
O teu peito uma janella
E o meu amor o luar!
Uma voz (_cantando dentro_)
As estrellas mais brilhantes,
Entre as outras as primeiras,
São os prantos de Maria
E o suor das Oliveiras.
MEPHISTOPHELES (_cantando n'uma guitarra_)
Ontem à tarde um homem das cidades
Falava à porta da estalagem.
Falava comigo também.
Léman azul, que, mudo e morto, jazes.
Quanto és feliz! assim podesse eu sel-o!
Nem a sombra dos montes, nem seu gêlo,
De turvar tuas agoas são capazes.
Minhas cartas inuteis de doutor
Eu rasgaria, é certo, com prazer,
Se eu podesse um dia vir a ser
Dessas ondas, um simples pescador.
Léman azul, nas agoas socegadas,
Quantas vidas tu levas confiadas!
Pareces ver meu mal, e escarnecel-o!
A alma sangra
Um sangue sem dor
Um sangue sem cor
_A Mayer Garção_
Descance de quando em quando...
Passar assim toda a tarde
Sempre bordando, bordando,
Sem que um momento desista,
Até faz pena! Não lhe arde
Nem se lhe perturba a vista?...
Descance de quando em quando...
Erga os olhos do bordado
E veja quem vae passando.
O trabalho alegra a gente,
Mas assim, tão aturado,
--Não lhe faz bem certamente.
Tu cujas azas tremulas
O meu olhar tornava;
Cujo trinado harmonico
Meus dias alegrava,
Ai, já não ouves!--Chamo-te,
E é vão este chamar!
Chegou a estação gelida;
Foi para te matar.
Nunca me has-de esquecer! Por bem seis annos,
Companheira leal
Tu me foste, avesinha;
Meiga entre as meigas, desprezando os campos,
Deslembrada da mãe, que, á noite, aninha
No movel cannavial.
Não sei que ha de divino, força é crêl-o
N'esses teus olhos d'uma luz tão pura
Que, ao vêl-os, tive logo por segura
Aquella paz que é meu constante anhelo.
Filha de Deus, nossa alma aspira a vêl-o;
Desprezando caduca formosura,
Ella, em seu giro eterno, só procura
A fórma, o typo universal do bello.
Não póde amar, não deve, uma alma casta
Fugaz belleza, graça transitoria,
Coisa que o tempo leva, o tempo gasta.