Geral

Oração

Outomno. Morre o dia.
Cae sobre as coisas placidas e calmas
Um véo de sombra e de melancolia
Que dulcifica e embrandece as almas.

        Todo o meu sêr se invade
De enervantes e mysticas doçuras,
De mansidão, de paz, de suavidade,
De sentimentos bons, de ideias puras.

        No coração prepassa
Uma piedade e compaixão serena
Por todos os validos da desgraça,
Por tudo quanto soffre e quanto pena:

O VELHO MUNDO

Eu vejo em toda a terra um vasto cemiterio,
A necrópole immensa, a campa dos colossos,
Aonde em paz descansa o velho megatherio,
Por entre a fauna morta, os carcomidos ossos!

E os grandes leviathaãs dos primitivos mares;
Os tremendos reptis, crueis, descommunaes,
Celebram no silencio as nupcias singulares
Dos seus residuos vis, com ricos mineraes!

MOCIDADE E MORTE.

Solevantado o corpo, os olhos fitos,
As magras mãos cruzadas sobre o peito,
Vêde-o, tão moço, velador de angustias,
Pela alta noite em solitario leito.

Por essas faces pallidas, cavadas,
Olhae, em fio as lagrymas deslisam;
E com o pulso, que apressado bate,
Do coração os éstos harmonisam.

É que nas veias lhe circula a febre;
É que a fronte lhe alaga o suor frio;
É que lá dentro á dor, que o vai roendo,
Responde horrivel íntimo ciclo.

Melancolias do outono!

Melancolias do outono! Eu quando além descubro,
Nas tristezas do campo, as filas mugidoras
Dos vagarosos bois que voltam das lavouras,
Compungem-me as crueis desolações d'outubro!

Das orlas do poente, afogueado, rubro,
Ó moribundo sol! com que poesia douras,
As formas triviaes das cabecitas louras,
Que, ás portas dos casaes, de bençãos tambem cubro!...

Solta o canto final a orchestra da folhagem:
São horas de partir; apresta-se a viagem,
E as noites dos saraus hão de voltar mais bellas!

*HÉLI! HÉLI!*

Quando elle, emfim, morrendo, elle o cordeiro,
Pomba mansa no ar pesado e immundo,
Pendeu-se como um lyrio moribundo,
Sobre a haste do tragico madeiro.

E lançando o espirito prufundo
Ao reino bello, grande, e verdadeiro,
Finou-se, emfim, chagado e justiceiro,
Ainda, ainda, perdoando ao mundo.

Um soldado romano vendo-o exposto,
E já morto na Cruz, com um desgosto,
Com a lança enristada o trespassou...

Esterilidade

Ao vê-la caminhar em trajo vaporosos,
Parece que desliza em voluptuosa dança,
Como aqueles reptis da Índia, majestosos,
Que um faquir faz mover em torno d'uma lança.

Como um vasto areal, ou como um céu ardente,
Como as vagas do mar em seu fragor insano,
— Assim ela caminha, a passo, indiferente,
Insensível à dor, ao sofrimento humano.

Seus olhos teem a luz dos cristais rebrilhantes,
E o seu todo estranho onde, a par, se lobriga
O anjo inviolado e a muda esfinge antiga,

Vae para um Convento!

Falhei na Vida. Zut! Ideaes caidos!
Torres por terra! As arvores sem ramos!
Ó meus amigos! todos nós falhamos...
Nada nos resta. Somos uns perdidos.

Choremos, abracemo-nos, unidos!
Que fazer? Porque não nos suicidamos?
Jezus! Jezus! Resignação... Formamos
No mundo, o Claustro-pleno dos Vencidos.

Troquemos o burel por esta capa!
Ao longe, os sinos mysticos da Trappa
Clamam por nós, convidam-nos a entrar...

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