a concha entreaberta
Autor: António Tê Santos on Sunday, 25 June 2023louvo a poesia porque ela robustece os meus ideais falidos; as transfigurações da minha alma e os meus sigilos candentes; a busca dum patamar duradouro para a minha idealidade.
louvo a poesia porque ela robustece os meus ideais falidos; as transfigurações da minha alma e os meus sigilos candentes; a busca dum patamar duradouro para a minha idealidade.
o recreio da alma situa-se longe do meu comportamento quando eu provoco os alvoroços furibundos que me descontentam; quando eu transplanto para mim próprio as angústias das multidões; quando eu recalco as farpas que me aleijaram.
lembro os dilemas que superei na passadeira duma austera liberdade para transmitir os pensamentos que absorvi; para enaltecer os imperativos que perfilhei; para ignorar aqueles que reiteraram os ditados antigos.
os liames da saudade desdobram-se pelos jardins da minha infância; pelos regaços protetores tão do gosto dos meus bailados afetivos; pela aprazível inocência com que dirigi os meus devaneios; pelos recantos onde me ocultei da severidade maternal.
jugulo os meus versos quando eles exacerbam as minhas dúvidas; quando eles desenvolvem várias formas de escaparem aos meus intentos profundos; quando eles produzem afirmações que fustigam o meu juízo.
são rosas que fantasio quando revolvo o meu destino e os meus temores prementes; quando esconjuro as tribunas sagradas de todas as crenças; quando recolho as alvas pétalas que os meus versos logram engendrar.
a reprovável atitude daqueles que injuriam quem caminha nas brasas da embriaguês; quem usufrui a plenitude dos seus desejos quando investe na dança inflamada das paixões; quem questiona a urbanidade daqueles que perfilham tabus ultrapassados.
saboreio a beatitude quando abandono os lugares do meu passado e as suas dúvidas caóticas: onde evoluí como um poeta desabrido para abastecer a minha inspiração; onde rasguei os diplomas da minha civilidade.
as panaceias que invento para moderar as minhas atuações discrepantes... os recados que elaboro para que a loucura não se apodere da minha vida desconforme... os conceitos que pesquiso para regar as flores da minha austera condição...
estou num oásis restrito onde não cabem as atrocidades nem as permutas mercantis; onde o bulício da vida não me apoquenta com os seus trâmites agoirentos; onde submeto os meus cânticos a uma requintada brandura.