Prosa Poética

Aos pés do acaso

Tormento, a primeira palavra que vem à mente; sinto, pois, angústia tenho ao deleite do movimento. O movimento atualiza as potências, ao tempo que rasga milhares de outras possibilidades, como uma veia perscrutada pela seringa. O vai e vem do acaso é lúgubre, ele me deixa medo, imagine só tudo o que pode ocorrer: tragédias, alegria, miséria e vidas. Morrer ou ser? Eis a dicotomia que ronda minha morada, feito gárgula faminta por carne fresca.

Incógnito silêncio

Ah, sabe-me tão bem este silêncio tão incógnito tão
Dissimulado, expectante, errante e quase congénito
Sem heterónimo abraça um soluço nómada e lacónico
 
Ah, como sabe bem desvendar da escuridão cada breu insólito
Flertar dos céus este plumoso sussurro vibrante e tão melódico

Inocência

Quando você foi embora, o mundo ficou monocromático. Inocência, não vê que a fresta da janela irradia tormento em minhas retinas? As velas se apagam, pois, o furacão letárgico destrói toda minha ínfima esperança. Hei de duvidar do senhor quando se sacrificou por nós, para que no fim existam penosos sujeitos como eu. Desovei minha alma, assim como todos os cadáveres que brutalmente joguei aqui no lago abandonado. Por que minhas lágrimas de sangue sempre decaem sobre esses rios e, sua rica cor azul permanece?

Beijo à chuva

Num manancial de sussurros a noite desabou num aguaceiro de
Beijos e caricias tórridas intensas e supramentemente hipertensas
A noite sensual e aperaltada adormece acalentada por delicodoces
Gargalhadas fiéis, flamantes e absurdamente revigoradas
 
A escuridão caiada de fluorescências notívagas luzidias e petrificadas

Palavras ao vento

Amar é tentador
quando palavras inaudíveis não
chegam ao coração
pode ter efeito, tom enganador
as palavras ao vento com ameno sentimento de amor ,
pipas no céu azul sem vento ,
não combinam
tristeza de menino, coração em dor
é melhor ser analfabeto ou residir num deserto abrasador .
Palavras ao vento é cavalo que não se sela
porque palavras ao vento são rápidas
e se despedem de toda verdade,
palavras podem ser desajeitadas
quando não são embriagadas de amor
Amar é estar despreparado

Silêncios indesvendáveis

Desancorada a luz flutua ao longo do horizonte estático
Analógicos são os silêncios fluindo no poente algo enigmático
Só um estóico e obstinado sussurro adormece além subtilmente profilático
 
Desencaixotado o tempo liberta cada hora resoluta e inabalável
A saudade desempoeira um gomo de solidões genéricas e inevitáveis
Na melancolia de uma prece nostálgica fervilham palavras tão inolvidáveis
 
Sinto e saboreio a gastronomia das memórias famintas e imperscrutáveis

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