Dedicado

No dia dos annos da Illustrissimo, e Excellentissimo Senhor Conde de Villa Verde...

_No dia dos annos da Illustrissimo, e Excellentissimo Senhor Conde de
Villa Verde, hoje Marquez de Angeja, em cuja caza o Author jantou_.

Senhor, talvez neste dia
Já cantei Versos polidos;
Porém em tectos cahidos
Não mora o Deos da Poezia.
Voou; e da testa fria
Me tirou o verde loiro,
E das mãos a Lyra de oiro;
Tudo em fim se foi co'a bréca;
Mas se a Aganippe se séca,
Não se ha de secar o Doiro.

_Ao Illustrissimo, e Excellentissimo Senhor Conde de Villa Verde, hoje Marquez de Angeja_.

Em sege estreita entaipados,
Sol á ilharga, Sol por cima,
Vinha eu, e o Padre Lima
Cheios de pó, e encalmados.
Eis-que na estrada atacados,

Párão as mulas baratas;
Cuidei eu que erão Piratas,
Que tirão vida, e dinheiro,
Fui ver se era o Clavineiro,
E achei duas Açafatas.

Irmã da caridade (A HENRIQUE GOES)

I

Muitos, ao vel-a, estacam deslumbrados,
Ficam como suspensos d'esse olhar
Mais timido que os olhos dos veados,
Mais candido que os raios do luar.

Indifferente á propria formosura
Segue, porém, impavida, serena,
De habito negro como a noite escura
E touca branca como uma açucena.

A linha esculptural do seu perfil
É d'uma correcção incomparavel.
É alta, aristocratica, gentil,
De brandos gestos e maneira affavel.

A' Illustrissima, Excellentissima Senhora D. Catharina Micaella de Souza

_A' Illustrissima, Excellentissima Senhora D. Catharina Micaella de
Souza, tendo feito a honra ao A. de lhe offerecer huma Vestia de Setim;
e pedindo-lhe este que lembrasse o Requerimento, em que seu Irmão
pertendia o Governo de hum Forte_.

Minha respeitoza mão
De seus limites não sai;
A escritura, que aqui vai,
Não he carta, he Petição;
Até ante os Thronos vão
Vozes em papel incluzas;
As minhas não vão confuzas;
São memorial mui claro;
Sou Poeta, dai-me amparo,
He obrigação das Muzas.

Esboceto (A PEREIRA BARATA)

Como uma semi-tinta de aguarella,
Côa-se a luz, dulcissima, velada
Atravez das persianas da janella,
Sobre a pequena sala alcatifada.

N'um cavallete, apenas debuxada,
A tons ceruleos, sobre larga tela,
Uma marina calma, socegada,
Com botes de pescar, vogando á vela.

Sobre a meza rodeada de cadeiras,
Destaca, entre revistas estrangeiras,
Um busto de mulher adolescente

E a brancura leitosa do teclado
Põe no piano, entreaberto, ao lado,
Um ar de monstro, arreganhando o dente.

Perdularia

(A PIO CAVALHEIRO)

Passou junto de nós, pedindo esmola,
Uma creança rota, magra, invalida.
Deitaste-lhe dinheiro na sacola,
Beijaste-lhe em seguida a face pallida.

Que feliz foi o pobre da sacola!
O seu desejo era bem mais modesto.
Podias dar-lhe unicamente a esmola
E a mim--dares-me o resto...

A HERMANN

A HERMANN

Por occasião d'um beneficio a um asylo

    «Conchega a mãi ao peito o filho caro;
    Estende a pomba as azas no seu ninho
          Pelos filhinhos seus.
    Embala o arbusto agreste; o fructo amaro.
    Guia a bussola o nauta em seu caminho,
          Como um dedo de Deus.

A Alberto de Oliveira

(IMPRESSÃO DA BIBLIA DO SONHO)

Emquanto os outros vão, ao som das guitarradas,
Capas a desfiar, batinas sem botões,
Entre explosões joviaes de intensas gargalhadas,
Cantando alegremente eroticas canções,

Elle despresa a vida, o riso, os corações
E n'um mystico horror d'almas fanatisadas,
Foge do mundo e vae, á busca de illusões,
Em frageis bergantins de velas enfunadas.

Talento peregrino o seu ideal recorda
Um extasis de monja em frente d'um altar,
Á hora em que o sol morre e a lua meiga acorda.

*D. QUICHOTE*

A Luciano Cordeiro

     O que é isto?

Nos tempos medivaes dos campeões andantes,
E das balladas como a do bom rei de Thule,
Andava D. Quichote em busca de gigantes,
Magro, tristonho, ideal, crente Fausto do Sul.

Batalhador juiz da Virtude e do Crime,
Defendendo o opprimido, a mulher, o ancião,
Corria o mundo assim, ridiculo e sublime,
Em seu magro corcel, sob arnez de cartão.

A D. CANDIDA NAZARETH

A D. CANDIDA NAZARETH

Por occasião da morte de sua irmã Rachel e, poucos dias depois, de sua mãi

    Despe o luto da tua soledade
    E vem junto de mim, lirio esquecido
            Do orvalho do céo!
    Tens nos meus olhos pranto de piedade,
    E se és, mulher! irmã dos que hão soffrido,
            Mulher! sou irmão teu.

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