O Penúltimo poema
Autor: Alberto Caeiro on Thursday, 3 January 2013
Escrito em 7-5-1922.
Também sei fazer conjecturas.
Há em cada coisa aquilo que ela é que a anima.
Escrito em 7-5-1922.
Também sei fazer conjecturas.
Há em cada coisa aquilo que ela é que a anima.
Cancei-me de tentar o teu segrêdo: No teu olhar sem côr,--frio escalpello,-- O meu olhar quebrei, a debate-lo, Como a onda na crista d'um rochêdo. Segrêdo d'essa alma e meu degrêdo E minha obcessão! Para bebe-lo Fui teu labio oscular, n'um pesadêlo, Por noites de pavor, cheio de medo. E o meu osculo ardente, allucinado, Esfriou sobre o marmore correcto D'esse entreaberto labio gelado... D'esse labio de marmore, discreto, Severo como um tumulo fechado, Serêno como um pélago quieto.
Senhora! a todas as novenas ides,
E porque vós lá ides, vou tambem.
É um descanço sem par ás minhas lides,
Aos meus males, e em summa faz-me bem.
Essas graças que tendes (vós sorrides?)
Só nas flôres as vejo, em mais ninguem.
Se o vosso corpo é magro como as vides,
Os cachos d'uvas que o cabello tem!
Fazeis-me andar n'uma continua roda,
Pelas igrejas da cidade toda,
S. Luiz de França, Encarnação e mais.
Morto ficou na rua
com um punhal no peito.
Não o conhecia ninguém.
Como tremia o farol,
mãe!
Como tremia o pequeno farol
da rua!
Era madrugada. Ninguém
pôde assomar-se a seus olhos
abertos ao duro ar.
Que morto ficou na rua,
que com um punhal no peito
e que não o conhecia ninguém.
Um Príncipe se aborrecia por só se dedicar a perfeição de generosidades
vulgares. Ele previa estonteantes revoluções do amor, e desconfiava que suas
mulheres pudessem bem mais que uma complacência enfeitada de céu e luxo.
Amo-te, flôr! Se te amo, Deus que o sabe
Que o diga a teus irmãos, que o céo povoam,
E ebrios de gloria canticos entoam
A quem no mar, na terra e céos não cabe.
Se te amo, flôr! que o diga o mar--que expelle
Quanto é dominio, beija humilde a praia:
Se mal que a lua lá das ondas sáia
Nas rochas me não vê gemer com elle.
(AMOR DE COSINHA)
Afinal D. Juan vinha, hoje, a morrer d'uma indigestão.
(Palavras d'um grande realista)
Cançado de vãos fogos de Bengalla,
Como Pansa odeei o Pensamento,
E abandonei os ideaes de salla
--Pelo amor da cosinha succulento!
E os meus fortes desejos sensuaes,
--Desejos que hão de dar na morte escura!--
Soluçam só--ó deuses immortaes!
Só pela ama d'um florído cura.