Geral

*Ah Deixem-me Dormir!*

O Poeta

Olá, bom velho! é aqui o _Hotel da Cova_,
Tens algum quarto ainda para alugar?
Simples que seja, basta-me uma alcova...
(Como eu estou molhado! é de chorar...)

    O povo

    O luar averte as orvalhadas sobre a rua!
    Jezus! que lindo...

Vamos! depressa! Vem, faze-me a cama,
Que eu tenho somno, quero-me deitar!
Ó velha Morte, minha outra ama!
Para eu dormir, vem dar-me de mamar...

        A S.^{ra} Julia

        São as Janeiras da Lua!

O Coveiro

A CANÇÃO DAS PERDIDAS

_A Vianna da Motta_

I

Quem por amôr se perdeu
Não chore, não tenha pena.
Uma das santas do céu
--É Maria Magdalena...

II

Minha mãe foi o que eu sou.
Eu sou o que tantas são.
Que triste herança te dou,
Filha do meu coração!

III

Meu pae foi para o degredo
Era eu inda pequena.
Se não morresse tão cedo,
Morria agora--de pena...

IV

E ha no mundo quem afronte
Uma mulher quando cae!
Nasce agua limpa na fonte,
Quem a suja é quem lá vae...

NA FOLHA D'UM ROMANCE

    Moldada ao bem nasci, mas debil planta
    Verguei de vicio ao sopro pestilente;
    D'entre o vicio porém minha alma ardente
    Castos hymnos a Deus saudosa canta.

    Ah! se um mentido affecto amor levanta
    N'um pobre coração inexperiente,
    D'elles a culpa é toda! uma innocente
    Não consulta a razão, razões supplanta.

    Cahi, verguei, Senhor! já pervertida
    Graças, beijos vendi, vendi belleza,
    Triste commercio de mulher perdida.

NÃO!

Tenho-te muito amor,
    E amas-me muito, creio;
    Mas, ouve-me, receio
    Tornar-te desgraçada.
    O homem, minha amada!
    Não perde nada, goza;
    Mas a mulher é rosa...
    Sim, a mulher é flôr!

    Ora e, a flôr, vê tu
    No que ella se resume...
    Faltando-lhe o perfume,
    Que é a essencia d'ella,
    A mais viçosa e bella
    Vê-a a gente e... basta.
    Sê sempre, sempre, casta!
    Terás... quanto possuo!

*TARDE DE VERÃO*

Trepam-lhe pelas janellas
Jasmins, cheirosas serpentes,
E soltam-se as bambinellas
Em pregas indifferentes.

Os lyrios que são uns ais
Suspiram melancholias;
Riem quadros sensuaes
Nas largas tapeçarias.

Satyro ri nas florestas
Niobe soluça magoas,
E escuta-se entre as giestas
A voz rythmica das agoas.

E á luz dubia dos occasos
Ensanguentados do Sul
As camelias dos seus vasos
Olham voltadas o azul.

Pages