A UM THEATRO ACADEMICO
Autor: Soares de Passos on Friday, 21 December 2012
Num dia excessivamente nítido,
Dia em que dava a vontade de ter trabalhado muito
Para nele não trabalhar nada,
_A Columbano_
La fleur des traditions nationales est flétrie. Mais libre a tous
de puiser, dans l'herbier cosmopolite des legendes, les admirables
pretextes à fiction qu'il recèle.
(_Litterature à Tout á L'Heure_.)
Sahira Santo Antonio do convento,
A dar o seu passeio costumado
E a decorar, num tom rezado e lento,
Um candido sermão sobre o peccado.
Amas-me a mim! Perdôa;
É impossivel! Não,
Não ha quem se condôa
Da minha solidão.
Como podia eu, triste,
Ah! inspirar-te amor,
Um dia que me viste,
Se é que me viste... flôr!
Tu, bella, fresca e linda
Como a aurora, ou mais
Do que a aurora ainda,
Mal ouves os meus ais!
Mal ouves porque as aves
Só soltam de manhã
Seus canticos suaves;
E tu és sua irmã!
Novembro. Só! Meu Deus, que insupportavel mundo!
Ninguem, viv'alma... O que farão os mais?
Senhor! a Vida não é um rapido segundo:
Que longas horas estas horas! Que profundo
Spleen o d'estas noites immortaes!
Faz tanto frio. (Só de a ver me gela, a cama...)
Que frio! Olá, Joseph! bota mais carvão!
E quando todo se extinguir na aurea chamma,
Eu botarei (para que serve? já não ama...)
As cinzas brancas, meu vermelho coração!
Je suis son pére.
(Flaubert)
Ninguem diria ao certo a edade que teria!
Era um velho devasso e histrião--bom guia
Para mostrar de noute, aos baços candieiros,
As casas de bordeis aos velhos estrangeiros.
Encontravam-o sempre a errar, imbecilmente;
Era alto, magro, hostil, e dava-se á aguardente--
Tinha um certo tremor em todo o corpo--o vinho
Dava-lhe um rir constante; tinha o sorrir mesquinho
E dubio que nos faz arrepiar mau grado;--
Fôra mendigo e actor, ladrão, bobo e soldado.
_Estando o A. doente, e mandando pedir algum prato á meza, aonde jantava
o sobredito Leigo_.
Hum estomago cansado,
De cuja antiga ruina
Tem sido cauzas iguaes
A molestia, e a Medicina;
Que tendo em si dos tres Reinos
As perigozas heranças,
Só não bebeo das Boticas
Os S. Migueis, e as balanças;
Hum estomago sem forcas,
E ás leis geraes ínfiel,
Que não trabalha em diamante,
Como o de Fr. Manoel;
_Olhos meus, cansados olhos,
O vosso officio he chorar_.
Nas Caldas, nas tristes Caldas
Alegria vim buscar;
Quiz de noíte ver o Sol,
Quiz achar fogo no mar.
_Olhos meus, etc._
Que importa mudar de terra,
E baldados passos dar,
Se a toda a parte a que os volto
Vai comigo o meu pezar.
_Olhos meus, etc._
Vejo pálidos doentes
Pela Copa passear,
Oiço de antigas molestias
Tristes effeitos contar.
_Olhos meus, etc._
Quando é que passará esta noite interna, o universo,
E eu, a minha alma, terei o meu dia?
Quando é que despertarei de estar acordado?
Não sei. O sol brilha alto,
Impossível de fitar.
As estrelas pestanejam frio,
Impossíveis de contar.
O coração pulsa alheio,
Impossível de escutar.
Quando é que passará este drama sem teatro,
Ou este teatro sem drama,
E recolherei a casa?
Onde? Como? Quando?
Gato que me fitas com olhos de vida, que tens lá no fundo?
É esse! É esse!