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*PALACIOS ANTIGOS*

A Anthero do Quental.

Bons castellos leaes nas rochas construidos,
Ás contorções do vento, á chuva ennegrecidos,
Que vamos admirar na angustia dos poentes;
Grandes sallas feudaes com tellas de parentes,
O que fazeis de pé, como entre os nevoeiros,
Os antigos heroes e as sombras dos guerreiros?!

A ***

    Pois se como sempre fomos
          Somos
    Pétalas da mesma flôr,
    E o que eu sinto, ou eu me illudo,
          Tudo
    Tambem sentes, gosto e dôr;

    Que te arraza os olhos d'agua?
          Magua
    Em que eu não deva tocar?
    Oh! mas se ha quem a suavise,
          Dize,
    Vou-lhe um suspiro levar.

*Febre Vermelha*

Rozas de vinho! Abri o calice avinhado!
Para que em vosso seio o labio meu se atole:
Beber até cair, bebedo, para o lado!
Quero beber, beber até o ultimo gole!

Rozas de sangue! Abri o vosso peito, abri-o!
Montanhas alagae! deixae-as trasbordar!
As ondas como o oceano, ou antes como um rio
Levando na corrente Ophelias de luar...

Camelias! Entreabri os labios de Eleonora!
Desabrochae, á lua, a ancia dos vossos calis!
Dá-me o teu genio, dá! ó tulipa de aurora!
E dá-me o teu veneno, ó rubra digitalis...

Aniversário de Álvaro de Campos

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.

*Testamento*

      Lego uma trança do cabello d'ella
      Para atar um cavallo á mangedoura
      E as cartas da flacida impostora
      Para embrulhar assucar e canella.

      Ao credulo rival, deixo, leitora,
      A licença de entrar pela janella;
      Outrosim deixo as ligas e a fivela
      Que cingiram a perna encantadora:

      Os beijos que me deu ficam comigo
      E a memoria das noites palpitantes
      Hade caber tambem no meu jazigo.

Aldeã

Podem dizer talvez que ella não tem
As fórmas peregrinas, delicadas,
Das cortezãs de peito de cecem
Que vão á noite aos bailes, decotadas.

Podem dizer talvez, e dizem bem,
Que ás suas faces tumidas, rosadas,
Falta a côr macilenta que convém
Ás virgens dos sonetos e balladas.

Á elegancia doente e vaporosa
Eu prefiro, comtudo, a fórma airosa
Do seu corpo gentil de mulher sã;

Por isso adoro e préso mais que tudo
Os seus olhos dolentes de velludo,
Os seus labios vermelhos de romã.

A Minha Piedade

A Bourbon e Meneses

Tenho pena de tudo quanto lida
Neste mundo, de tudo quanto sente,
Daquele a quem mentiram, de quem mente,
Dos que andam pés descalços pela vida,

Da rocha altiva, sobre o monte erguida,
Olhando os céus ignotos frente a frente,
Dos que não são iguais à outra gente,
E dos que se ensangüentam na subida!

Tenho pena de mim... pena de ti...
De não beijar o riso duma estrela...
Pena dessa má hora em que nasci...

Oh retrato da morte, oh noite amiga

Oh retrato da morte, oh noite amiga
Por cuja escuridão suspiro há tanto!
Calada testemunha do meu pranto,
Des meus desgostos secretária antiga!

Pois manda Amor, que a ti somente os diga,
Dá-lhes pio agasalho no teu manto;
Ouve-os, como costumas, ouve, enquanto
Dorme a cruel, que a delirar me obriga:

E vós, oh cortesãos da escuridade,
Fantasmas vagos, mochos piadores,
Inimigos, como eu, da claridade!

OS PALHAÇOS

Heroes da gargalhada, ó nobres saltimbancos,
Eu gosto do vossês,
Por que amo as expansões dos grandes rizos francos
E os gestos d'entremez,

E prezo, sobretudo, as grandes ironias
Das farças joviaes,
Que em visagens crueis, imperturbaveis, frias,
Á turba arremeçaes!

Alegres histriões dos circos e das praças,
Oh, sim, gosto de os ver
Nas grandes contorsões, a rir, a dizer graças
Do povo enlouquecer,

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