Da mais alta janela da minha casa
Autor: Alberto Caeiro on Monday, 26 November 2012
Da mais alta janela da minha casa
Com um lenço branco digo adeus
Aos meus versos que partem para a Humanidade
Da mais alta janela da minha casa
Com um lenço branco digo adeus
Aos meus versos que partem para a Humanidade
(De Catullo Mendés)
O Budha scisma, as mãos sobre os artelhos.
Aquelle então que ouvira os seus conselhos
Diz:--Mestre! os que não foram resgatados
Do Mal, são como uns ceus anuviados!
Aos povos que d'aqui moram distantes,
Para que a Lei não errem, ignorantes,
Consente que affrontando os soes e os frios,
Montes, rochas, passando a nado os rios,
Teu grande dogma, ó Mestre, eu vá prégando!...
--Mas se elles, corta o Budha venerando,
Te insultarem, eleito! que dirás?
Altos pinheiros septuagenarios
E ainda empertigados sobre a serra!
Sois os Enviados-extraordinarios,
Embaixadores d'El-Rey Pan, na Terra.
A noite, sob aquelles lampadarios,
Conferenciaes com elle... Ha paz? Ha guerra?
E tomam notas vossos secretarios,
Que o _Livro Verde_ secular encerra.
Hirtos e altos, Tayllerands dos montes!
Tendes a linha, não vergaes as frontes
Na exigencia da côrte, ou beija-mão!
Contempla esse perfil de graças florentinas;
Na sóbria ondulação do corpo musculoso
Excedem Força e Proporção, irmãs divinas.
Essa mulher, fração de um ser miraculoso,
Divinamente forte, amavelmente pobre,
Criada foi para no leito arder em gozo,
Saciando os ócios de um pontífice ou de um nobre.
Em huma frondosa
Roseira se abria
Hum negro botão.
Marilia adorada
O pê lhe torcia
Com a branca mão.
Nas folhas viçosas
Á abelha inraivada
O corpo escondêo.
Tocou-lhe Marilia,
Na mão descuidada
A fera mordêo.
A penas lhe morde,
Marilia gritando,
C'o dedo fugio.
Amor, que nos bosques
Estava brincando,
Aos ais acudio.
Se da Amada estás ausente
Como o Oriente do Ocidente,
O coração transpõe todo o deserto;
Só, por toda a parte acha o seu caminho certo.
Para quem ama Bagodá é aqui perto.
Nessa tarde mimosa de saudade
Em que eu te vi partir, ó meu amor,
Levaste-me a minh'alma apaixonada
Nas folhas perfumadas duma flor.
E como a alma, dessa florzita,
Que é minha, por ti palpita amante!
Oh alma doce, pequenina e branca,
Conserva o teu perfume estonteante!
Quando fores velha, emurchecida e triste,
Recorda ao meu amor, com teu perfume
A paixão que deixou e qu'inda existe...
Só de ouro falso os meus olhos se douram;
Sou esfinge sem mistério no poente.
A tristeza das coisas que não foram
Na minha'alma desceu veladamente.
Na minha dor quebram-se espadas de ânsia,
Gomos de luz em treva se misturam.
As sombras que eu dimano não perduram,
Como Ontem, para mim, Hoje é distancia.
Já não estremeço em face do segredo;
Nada me aloira já, nada me aterra:
A vida corre sobre mim em guerra,
E nem sequer um arrepio de mêdo!
Trazidos pelo Amor, que por instantes,
O veu ergue á Verdade,
Por nós á luz vieram, quaes prestantes
Peões da Humanidade!...
Amor é quem dos ceus nos abre a porta,
Nos deixa vêr o intuito
De Deus na Terra, e a elle nos transporta
Da amante o olhar fortuito!
Como assim jaz e solitaria e quèda
Esta cidade outr'ora populosa!
Qual viuva ficou e tributaria
A senhora das gentes.
Chorou durante a noite; em pranto as faces,
Sósinha, entregue á dôr, nas penas suas
Ninguem a consolou: os mais queridos
Contrarios se tornaram.
Ermas as praças de Sião e as ruas,
Cobre-as a verde relva: os sacerdotes
Gemem; as virgens pallidas suspiram
Involtas na amargura.
Dos filhos de Israel nas cavas faces
Está pintada a macilenta fome;