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ULTIMO ADEUS

    Prestes, se inda na rocha de granito
    D'onde em tempo me vias te sentares,
    Não olhes para a terra ou para os mares,
    Olha sim para o céo, que é lá que habito.

    Lá tão longe de ti, mas não do terno,
    Bondoso pai que os dois nos ha gerado,
    Só para mágoas não, que bem guardado
    Nos tem tambem no céo prazer eterno.

    Não se é só pó no fim de tanta mágoa.
    Senão, diga-me alguem que allivio é este
    Que sinto, quando á abobada celeste
    Alevanto os meus olhos rasos d'agua.

A DONZELLA E O MUSGO

    Um dia, não sei que eu tinha...
    Uma tristeza tamanha!
    E lembra-me ir á montanha,
    Que temos aqui vizinha,
    Onde em tempo me entretinha
    Horas e horas sósinha
    Quando ainda se não estranha
    Que n'uma teia de aranha
    Se prenda uma innocentinha,
    Ou atraz d'uma avesinha
    Se cance a vêr se a apanha.

Elevação

Por cima dos paúes, das montanhas agrestes,
Dos rudes alcantis, das nuvens e do mar,
Muito acima do sol, muito acima do ar,
Para além do confim dos páramos celestes,

Paira os espírito meu com toda a agilidade,
Como um bom nadador, que na água sente goso,
As penas a agitar, gazil, voluptuoso,
Através das regiões da etérea imensidade.

Eleva o vôo teu longe das montureiras,
Vai-te purificar no éter superior,
E bebe, como um puro e sagrado licor,
A alvinitente luz das límpidas clareiras!

_A' Illustrissima, e Excellentissima Senhora Condeça de Tarouca, na occasião do seu Casamento_.

Senhora, o Forte da Estrella,
Chorando o bem que perdeo,
Das suas justas saudades
Por portador me escolheo;

Quiz que eu viesse contallas
Ao som desta rouca Lyra,
De longos annos affeita
A acompanhar quem suspira;

Não fallo nos ternos Pais;
Nelles a alta Jerarquia
Tempéra saudozo pranto
Com o pranto da alegria;

Ao nome dos seus Passados
Planos caminhos achárão,
Unindo ao sangue de Heróes
O sangue de Heróes que herdárão;

*Vendetta*

     Juraste a minha perdição, ingrata,
      A quem adóro como adóro a vida
      Casta flôr, flôr de neve estremecida,
      Que sorris, quando o teu olhar me mata.

      Gravei no peito aquella rubra data
      Em que te vi, amor! qual na avenida
      Se entalha na fiel casca endurcida
      O nome da huri, que nos maltracta

      E, apesar de seres tão bella e mansa,
      Folgas que a desventura me persiga
      Dilacerado de cruel esp'rança.

Alma a Sangrar

Quem fez ao sapo o leito carmesim
De rosas desfolhadas à noitinha?
E quem vestiu de monja a andorinha,
E perfumou as sombras do jardim?

Quem cinzelou estrelas no jasmim?
Quem deu esses cabelos de rainha
Ao girassol? Quem fez o mar? E a minha
Alma a sangrar? Quem me criou a mim?

Quem fez os homens e deu vida aos lobos?
Santa Teresa em místicos arroubos?
Os monstros? E os profetas? E o luar?

Ó trevas, que enlutais a Natureza

Ó trevas, que enlutais a Natureza,
Longos ciprestes desta selva anosa,
Mochos de voz sinistra e lamentosa,
Que dissolveis dos fados a incerteza;

Manes, surgidos da morada acesa
Onde de horror sem fim Plutão se goza,
Não aterreis esta alma dolorosa,
Que é mais triste que voz minha tristeza.

Perdi o galardão da fé mais pura,
Esperanças frustrei do amor mais terno,
A posse de celeste formosura.

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