Medo de Altura
Autor: André Claro on Wednesday, 13 December 2017
Tenho medo de altura
acho que é por isso que ando
sempre com o pé atrás
vai que eu olhe tudo por cima
vai que me joguem para baixo.
Tenho medo de altura
acho que é por isso que ando
sempre com o pé atrás
vai que eu olhe tudo por cima
vai que me joguem para baixo.
Tento escrever à força a poesia
devaneando paisagens, obituários,
amores fugidios
mas verso algum vem — obrigado!
poesia é um vírus incubado
um ato falho dantesco
onde a rima é outorgada
no momento de maior fraqueza
prolifera-se bolidamente
é um ataque às nossas
maiores resistências
aquele que a concebe
é quase sempre o mais frágil
nem tanto o disciplinado, o exigente
por isso abandono minha Lettera 25
desisto do batente
não depende de minha vontade
nem de minha métrica ou ritmo
métrica!
antes de dormir, me perdoo
Queria te querer
como quem quer nada
só por querer
um querer o outro
sem querer do outro
querendo por querer
é, mas também não quero
querer sem o outro
um querer
o outro sem querer
quero, mas não é que eu queira
querer porque quero
do outro um me querer
isso seria apenas querer que me quisesse
como quem nada quer
— na verdade verdadeira
querer-te eu queria.
Na estrada, à tarde, mais “de” tardezinha, grudando em nossos suados rostos aquela poeirinha fina tão fina quanto agora os nossos ossos que não suportariam mais nada a não ser um filho esperando pra bola
O caminho me encontrou
sem escolha, voltei a caminhar
mas senti falta da dúvida
de me fincar em qualquer lugar
sem saber para aonde se vai
talvez eu nunca quisesse ir
nem caminhar, nem chegar
e na certeza de outra vez
perdidamente me descaminhar
vou deixando o caminho para trás.
Sem o barulho do mundo,
Para não falar silêncio,
Ouve-se a fina e persistente
Melodia da chuva noturna.
Se bem que
Alguns ainda a desfortunam,
Levam sua quietude à falência,
Uns com suas carências rugosas,
Outros com suas histerias inconvincentes.
Enquanto isso, são incapazes de notar
A vida escorrendo à surdina,
Sem um só refrão,
Ora para a música da arrebentação infinda,
As ondas num estribilho a divagar,
Ora para a culpa e sua disfonia
Sem nenhum perdão.
Não consegue dizer não, seja lá por medo...
Se diz, a faca da culpa lhe corta o peito,
Se não, o ódio de si lhe pesa as costas,
Tantas as coisas sem poder carregar postas.
Tão simples o não, e nunca dito,
Insiste no sim, que em não se volta contra ele,
Nega-se a não dizer o sim maldito,
Até quando mais se pode e deve.
E mais a si mesmo deve.
É, na verdade, cobrado pelo indébito,
Por tão inapropriadamente se tratar.
E mais vai devendo de tanto se doar.