Prosa Poética

Em trânsito...

Desabotoei de mansinho
 
as cores e o destino que desvanece
 
na tarde
 
lembrando o contorno de cada palavra
 
ouvida e sentida nas preces errantes
 
 
– Decorei um mundo de
 
perguntas que nunca fiz
 
arrastando as horas
 
até ao declive onde morre o tempo
 
elaborei todas as respostas
 

À beirinha do mar

Ficarei assim
 
à beirinha do mar
 
quando assim me procurares
 
abrindo as portas da vida
 
no regresso abreviado
 
onde em formosas cascatas
 
te faço primavera afeiçoada
 
 
À beirinha deste mar
 
iremos
 
tu e eu, amainando os
 
mesmos leitos onde correm
 
nossos rios
 

Com três palavras

Pois então
 
o que direi  somente
 
com três palavras apenas
 
se meus silêncios
 
calarem fundo
 
todo e qualquer sinónimo
 
na inconformada ausência
 
que entrelaçámos no tom
 
boémio das fascinadas canções
 
 
Que direi então
 
quando farejando a noite
 
te atrair à Lua comovida

Fossem meus olhos...

Fossem meus olhos
 
bordados nos imensos céus
 
onde pairam os silêncios teus
 
e então trocaria de vez
 
o sentido impaciente com que descrevo
 
nossa entrega
 
sem indiferenças nem contemplações
 
à luz de plenas
 
recompensas e escravizantes ilusões
 
 
– Que me ornamentes as palavras
 

Essa luz...

Reflecte-me essa luz
 
que toda a manhã de ti
 
se desprende espantando
 
a noite
 
despindo o dia que celebramos
 
em estações frutíferas de amor
 
 
– Irrompe comigo
 
neste jazigo onde ressuscitámos
 
toda a poesia em nós viva
 
em secretas clausuras
 
de ternura e valentia
 
 

Ondas silenciosas

– Serão as ondas do mar
 
um espelho
 
que espelha a correnteza
 
da alma insegura
 
reflectida em oceanos de transparências
 
num tempo que alinho em cada
 
bruma amanhecida em ti
 
 
– Serão tempestades silenciadas
 
na mais fina textura dos meus versos
 
repletos de brisas embarcadas
 

Deixa o sonho...

E se deixássemos
 
os sonhos
 
nos invadir sem opção sequer
 
de contornar os destinos
 
com data marcada para molestar
 
antecipadamente
 
o que resta da ausência
 
no fim de cada sílaba modulada
 
pelos ponteiros do tempo que cessa.
 
 
E se deixássemos
 
que a tarde nos procure
 

Infinitamente

Aprendi com o tempo
 
a domesticar minha audácia
 
com sentido de vida
 
minha fúria confundida
 
no limiar da razão derradeira
 
 
Aprendi com a vida
 
como soletrar os dissabores
 
que o tempo impregna a alma
 
sem nunca ressarcir de poesia
 
todos os apelos que sustento
 
e domestico
 

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