Soneto

“Água de Vontade”

  

Um encontro, um poema;

Uma luz aberta no horizonte;

Um grito na voz, que solte o dilema!

Um rio; duas margens; uma ponte…

 

Deste lado: A amargura no peito;

Do outro: O sonho mais persistente…

Na ponte: O esforço, de tal jeito

Qual, da vontade, sobre à vertente…

“O Encontro”

 

Escrevo como uma viagem inconsciente;

Cônscio do encontro, na busca distante…

No horizonte, de mim, a mina, a luz, a nascente;

O fundo de um mapa vago, numa tela penetrante…

 

Funduras, a terra tem de sobra;

Profundidades, o céu as tem, também;

Não falta ao Mundo, quem lhes abra a cova,

“Ter ou não ter”

  

Há, no meu peito, um mar em tempestade;

Uma efervescência de vapores no horizonte…

Nos meus olhos, dois Mundos, uma saudade

Um licor precioso, bebido, de mim, como fonte;

 

Na minha garganta, seca-se a dor… Que me deixe,

Gritando em silêncio, a fúria que a voz encrava…

Salvação

Faz do passado
O nunca mais,
O tempo desperdiçado
Não trará felizes finais.
 
Torna o futuro desejado
No presente que desejais,
E o tempo inacabado
Será fonte de coisas reais.
 
A roda só gira
No sentido
Em que a fizeres girar.
 
A vida suspira
Pelo sentimento decidido
Que faças levantar.
 
 
Este poema faz parte do seguinte livro:

Cada Alma Minha Prostrou-se Para Vossa Longa Vida Vê-la

AA
África, entoa o canto das lágrimas do vosso partir,
vós que por muito gladiastes, por cada seu irmão;
se o tempo tanto enciuma-vos por acenar-nos a mão,
então durmam ternamente e deixem-nos vosso sorrir.

BB
Beijar-mo-eis o silêncio do vosso andar co'este sentir,
hiper tristonho, que por vos ver ir, murcha nosso coração;
mas, sabe o vosso destino que deu-vos... pela sua ilusão,
ao outro mundo, embora sem nosso... coração assentir.

Perpétuo é o paraíso de vosso único corpo

Perpétuo é o paraíso de vosso único corpo,
Que por toda vida muito o viemos desejar,
Embora sempre nosso coração tanto alvejar,
A queremos no seu interior que mendiga louco.

Façam mil clones de vós; mas ainda será pouco,
Se mais mil darem-nos para possuir e farejar;
E mais outros mil de vós nosso desejo vir forjar,
Olhos nossos não radiarão; o coração tampouco.

Perpétuo até é o sabor do vosso doce linguajar,
Que contam perpétuos segredos de vossos lábios,
Que dilaceram nossos ouvido com vossa vaga voz.

Vida Minha Por Muito Já Morta

Ó ! Vida minha por muito tempo já morta !
Melhor és que todas outras minhas vivas,
Se o tempo que o traz te dê tanta volta,
Aqui estarei esperando-á com as brisas.

Em mim volte e continuarás viver solta,
Vinde á minha alma para que o avivas,
Nem que sobrar de si apenas uma gota;
O teu fôlego meu, traga no coração que poetisas.

Tão cruel tem sido o tempo para contigo,
Como para conosco diferente não tem sido;
Rasgando o nosso enfermo coração à alma;

Soneto da Maior Saudade

Mas que contemplar insana vaidade

Riqueza, arte pura do semblante

É ter-lhe em minhas mãos completa divindade

Com o prazer e o olhar dardejante

 

Aéreo, na palidez do tempo e do espaço,

Sou e vivo a fitar desmedida graça

Que não se escapa muito menos se disfarça

Na plenitude do meu dia escasso

 

Não há dia que eu não peça

Que faças parte de um paraíso, nume

Algo de valor que ao meu sangue cessa

 

E enquanto longe estiver teu olhar que doura

Dói-me a ausência do imortal lume

Epifania

(Soneto com influência do simbolismo, um dos movimentos literários que mais gosto)

 

Luzes Sublimes como Noite de quermesse

Deliram e sublimam e vão dardejar

Nas infinitas glórias que vão cintilar

Em todo luar que derrama e efloresce

 

Puras e sagradas escorregam

Pela minha mente estéril, gelada

Estéril e gelada por ela se esfregam

Todas nuas de brancura vulcanizada

 

Propiciam-me a arte de imaginar

Aladas alegrias do Céu me propiciam

Saber o indefinível e o infinito.

 

A Loira Fogo Que Ardia

A loira fogo que ardia,
Tão alta brasa elevou;
De paixão se espalhou,
Que o enfogo eu sentia.

Além, meu coração via,
Um amor que começou,
Quando sua voz rasgou;
Alma minha antes fria.

Em todos de mim havia,
Incerteza do que forte vinha,
Dos seus desejos vulcões;

Se era devaneio, já o tinha,
Embora deteste paixões;
Meu coração tanto a vivia.

António Vicente Aposiopese

Pages