BEIJO QUE ME BEIJA
Autor: Vera Helena on Saturday, 9 November 2013BEIJO QUE ME BEIJA
Mordo a língua que me língua
Sorvo a saliva gota a gota
Bebo você de canudinho
Bem devagar...degustando
Cada pedaço...cada sabor
Só morta me calarão
Nas ruas erguerei os punhos
Na liberdade que me querem roubar
Vou juntar-me aos famintos
Aqueles a quem é roubada a dignidade
“Paz, pão, trabalho, habitação”…
De novo o refrão que me levará à rua
Seja ela de dor ou amargura
Que me algemem
Que me amordacem
O grito continuará a ecoar
Como farpa perdida na noite
Serei de novo a canção
Serei de novo a espada
Ou apenas a pedra
Mas escrava, não!
Pausada a democracia
Continuo a gritar Liberdade
Suspendi o tempo que me pousou nas mãos
Ave livre sem destino nem porvir
Olhei nas águas lavradas do rio
O desassossego que me habita nos olhos
E sorri
Do peito brotaram-me flores em cacho
Com cheiro a terra e a musgo
Com cores que envergonharam o arco-íris
Estendi-me, dolente
Nas margens deste rio calado
E esperei a lua
Lânguida
Foi meu o mundo todo num momento
Em que desbravei um peito a arder
Senti-me em mim
De volta
E a minha gargalhada
Abro asas na noite escura e parto vestida de breu na busca do sonho esquecido que um dia se perdeu. Sou só eu e o céu, onde se escondem estrelas sem brilho, nos caminhos onde a alma um dia se escondeu.
Ao longe um murmúrio dolente, do meu rio entre fragas… tão manso e solto como a noite, tão livre e perdido…como eu! Amanhã, amanhã talvez a luz me encadeie o peito e um sorriso me vote a fazer sonhar.
Trago silêncios presos nas mãos que se abrem em busca vã. Trago mordaças rasgadas por onde se solta o grito mudo.