Dedicado

Vigília

Meu Ocaso, minha irmã, meu sono...

Dei-me a beber.
Sou menos meu e mais do outro.
Como adivinharia os dedos por trás do mundo?

Depois de ti varreram-me o azul dos dias.

Tenho demasiada Europa derramada sobre mim...
Já não posso voltar.
Sinto-me banido.

Depois de um deserto vem outro.
Atrás de um Inferno, Outro.

Estou doente,
faz frio dentro de mim.

Santa Maria...A última dança.

Não mais resta tempo para a última dança.

Só correria,

A alegria transforma-se em pavor,

O ar negro tomou conta dos seres, dos ares, 

vida bela que se esvaia, se desfaz como a própria nuvem negra.

Aprendizado assinado por vidas,

vidas que se deram o luxo pela última dança,

pela última dança em Santa Maria.

 

"As vítimas do incêndio em Santa Maria-RS"

 

a rosa que te dei

a rosa que te dei

 

a rosa que te dei
a rosa que murchou
no dia que chorei
e nada mudou

era a mais bela que vi
era a mais encorpada
olhei-a e percebi
que me sentia culpada

foi com ela que me deixas-te
foi com ela que te recordo
na tua mão a levas-te
do sonho que não acordo

um sonho bem real
que deixou uma saudade imensa
nesse dia mortal
apagou-se a chama intensa

A FRANCISCO CEZIMBRA

    Eu chegara de França uns quatro dias antes
    E via-me tão só n'um deserto sem fim,
    Lá deixara a alegria, amores, estudantes,
    Via a vida, aqui, negra adiante de mim.

    Que havia de fazer? Eu não tinha um desejo,
    Nada no mundo me podia estimular!
    Ai quantas vezes, ao passar junto do Tejo,
    Perdoa-me, Senhor! pensei em me afogar!

*A UM LYRIO*

(A. A.)

Conta como é que existe
A tua vida á luz,
Lyrio mais casto e triste
Que os olhos de Jesus!

Quando nasceste, flor?
Quem te arrancou do chão?
Gérou-te occulto amor
De morto coração?

Ó lyrio delicado!
Ó lyrio branco e fino!
Talvez fosses creado
N'um seio femenino!

Escuta ó lyrio amado!
A flor confunde os sabios...
Talvez fosses os labios
D'aquella que hei amado!...

LÚDICO

 

a Ângelo Gabriel

 

Filho que pai

Sem parte inteiro

E fica de mãe abanando

O leite chorado das mãos.

Pipoca de dor a saudade

Que lambe o meu carrossel

E brinca de longe pertinho

De cabra-cega no escuro

De ´tô-no-poço´ sem fim

Num quebra-cabeça de sonho

Que corre o tempo ligeiro

E esconde-esconde de mim.

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