VIDA
Autor: Walt Whitman on Friday, 1 February 2013Sempre a indesencorajada alma do homem
Sempre a indesencorajada alma do homem
I
Os labios são dois imans de desejos.
A bocca, então, é calix de venenos
Com infusão de beijos.
Eu, se o mortal licor provasse ao menos
Alguma vez sómente,
Envolto já nas sombras da agonia
Ainda um beijo mais lhe pediria
--Para morrer contente...
II
Rasga do céu
A ponta do vestido
Cada quarto
E quadro coberto.
De um lado quebrado
Do outro concertado
O verbo e presente.
A quem está perto
Ou longe da gente.
Não se apoquente
Um dia você acaba voltando
Lendo e tomando café quente
Revisitando tudo que sente.
Se quiserem que eu tenha um misticismo, está bem, tenho-o.
Sou místico, mas só com o corpo.
A minha alma é simples e não pensa.
Tenho, ás vezes, desejos delirantes
De a todos te roubar, meu lyrio amado!
E levar-te, em um vôo arrebatado,
Aos paizes phantasticos, distantes.
Á India, China ou o Iran, e os meus instantes
Passal-os a teus pés, grave e encrusado,
N'um tapete chinez, avelludado,
Com flores ideaes e extravagantes.
Nossa vida seria, ó pomba minha!
Mais leve do que a aza da andorinha...
E, nas horas calmosas, eu e tu...
Eu tambem já em tempos não distantes,
Fiz versos sensuaes e namorados,
Aos occasos de luz ensanguentados,
E á meiga e boa lua dos amantes.
E escrevi pelos albuns elegantes
Idyllios em papeis assetinados,
E, como a luz dos ponches inflammados,
Fiz odes ideaes e extravagantes.
Mas hoje emfim mudei, e inda ha bem pouco,
A diva por quem choro e vivo louco,
--A flor, a flor ideal das maravilhas...