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LYRA XXIII.

N'um sitio ameno
Cheio de rosas,
De brancos lyrios,
Murtas viçosas;

  Dos seus amores
Na companhia
Dirceo passava
Alegre o dia.

  Em tom de graça,
Ao terno amante
Manda Marilia
Que toque, e cante.

  Péga na lyra,
Sem que a tempere,
A voz levanta,
E as cordas fere.

  C'os doces pontos
A mão atina,
E a voz iguala
A voz divina.

  Ella, que teve
De rir-se a idéa,
Nem move os olhos
De assombro chêa.

CARTA: _Sobre o mesmo Assumpto_.

Senhor, assim que eu largar
A baetal fatiota minha,
Vou beijar as pias lágeas
Da vossa farta Cozinha;

Não foi attento Hespanhol,[10]
Receitando amarga quina,
Quem venceo meu mal co'as armas
Da fallivel Medicina;

[Nota de rodapé 10: Medico.]

Vós sabeis traçar receitas
Mais gratas, e mais felizes:
Curárão-me oppostos males
Bem applicadas Perdizes;

Humas o appetite abrírão,
Outras socêgo lhe dão;
Sarárão as duas chagas
Co'pêllo do mesmo cão:

Não te Arrependas

Não te arrependas, Amada, porque a mim tão depressa
                                                                              te deste!
Podes crer, nem por isso de ti penso coisas insolentes
                                                                              e vis!
Vária é a acção das setas do Amor: algumas arranham,
    E do rastejante veneno languesce pra anos o peito.
Mas, com penas potentes e gume afiado de fresco,
Outras penetram até ao tutano e rápido inflamam

Os Mochos

Sob os feixos onde habitamn,
Os mochos formam em filas;
Fugindo as rubras pupilas,
Mudos e quietos, meditam.

E assim permanecerão
Até o Sol se ir deitar
No leito enorme do mar,
Sob um sombrio edredão.

Do seu exemplo, tirae
Proveitoso ensinamento:
— Fugí do mundo, evitae

O bulício e o movimento...
Quem atrás de sombras vae,
Só logra arrependimento!

O Cachimbo

Trigueiro, negro, enfarruscado,
Sou o cachimbo d'um autor,
incorrigível fumador,
Que me tem já quase queimado.

Quando o persegue ingente dôr,
Eu, a fumar, sou comparado
Ao fogareiro improvizado
Para o jantar d'um lenhador.

Vae envolver-lhe a tova mente
O fumo azul e transparente
Da minha bôca em erupção...

A sua dor, prestes, se acalma;
Leva-lhe o fumo a paz á alma,
Vae Alegrar-lhe o coração!

A sepente que dança

Em teu corpo, lânguida amante,
Me apraz contemplar,
Como um tecido vacilante,
A pele a faiscar.

Em tua fluida cabeleira
De ácidos perfumes,
Onde olorosa e aventureira
De azulados gumes,

Como um navio que amanhece
Mal desponta o vento,
Minha alma em sonho se oferece
Rumo ao firmamento

Teus olhos que jamais traduzem
Rancor ou doçura,
São jóias frias onde luzem
O ouro e a gema impura.

NOVA LUZ! NOVO IDEAL!

Espirito Supremo, d'onde brota
      A luz que eterna os mundos alumia,
      E deixa pelo espaço uma harmonia
                  Echo da tua vóz!
      Inspira-me a assistir, sereno e impavido,
      Ao funebre ruiz do christianismo,
      E d'este inevitavel cataclysmo
                  Salva-te a ti e a nós!

AO NOVO CYCLO HISTORICO: AO TRIUMPHO DO ESPIRITO

      Homem! sob o docel das fulgidas estrellas,
      Que espalham pelos ceus de Deus o Ideal jocundo,
      Surgiste insciente e nu, por entre mil procellas,
      A custo iniciando o teu Poder no mundo!...

      A Terra, que ha de ser mais tarde o teu Imperio,
      Theatro e pantheon dos teus tropheus de gloria,
      Prendeu-te inerme e escravo, e impoz-se ao teu criterio
      Terrivel como um Deus, no escuro humbral da Historia!...

Noite Trágica

O pavor e a angústia andam dançando...
Um sino grita endechas de poentes...
Na meia-noite d´hoje, soluçando,
Que presságios sinistros e dolentes!...

Tenho medo da noite!... Padre nosso
Que estais no céu... O que minh´alma teme!
Tenho medo da noite!... Que alvoroço
Anda nesta alma enquanto o sino geme!

Jesus! Jesus, que noite imensa e triste!
A quanta dor a nossa dor resiste
Em noite assim que a própria dor parece...

Meu ser evaporei na luta insana

Meu ser evaporei na luta insana
Do tropel de paixões que me arrastava:
Ah! cego eu cria, ah! mísero eu sonhava
Em mim quasi imortal a essência humana!

De que inúmeros sóis a mente ufana
Existência falaz me não dourava!
Mas eis sucumbe Natureza escrava
Ao mal, que a vida em sua origem dana.

Prazeres, sócios meus, e meus tiranos!
Esta alma, que sedenta em si não coube,
No abismo vos sumiu dos desenganos

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