Soneto

Sem resposta

Não me respondes, quando eu te chamo

Ainda que aflita seja a minha voz

A morrer da dor que provocamos nós

Deixas-me aqui, só e abandonado

 

Não foi esta a imagem com que sonhamos!

Vagas de tristeza e ondas de solidão

Afogam-me no mar desta condição

Em que só eu vivo e que nós criamos

 

Porque me queres aqui triste e desabrigado!

Para sempre náufrago perpétuo e condenado

Em dor consumido e neste atropelo

 

Sem a tua imagem, com que tenho sonhado

Mais valera que me tivesses afogado

Manual do amanhã

Não acalentar este menino - o futuro
Ouro e prata em terra de cego não é oferta
Armadura de ferro, que o caminho é duro
O futuro dorme e a fúria de Deus não desperta

Não planejar desordenada vitória
Mas não ignorar a luta, a rota
Não fugir do passado da historia
Não desistir à primeira derrota

Não desejar antes sem estratégia vencer
Pois a luta não beneficia os desarmados
O bem é sempre o maior guardião e aliado.

A sinfonia última

Corda do celo rasga a nota,
do último trágico som,
mortal à alma já quase morta.
Mitigado no penumbre bom.

Fúnebre adágio nos ouvidos
é o turíbulo que pendula lembrança.
Nostalgia de dias anímicos,
marcados com pureza de criança.

Luctíssono é sensível ao toque.
Do garoto colérico ao austero sujeito,
escuro mundo de sentimento fechado.

Espelho manchado de desfoque,
é o reflexo penoso do homem afeito.
Sinfonia lamentosa do ser apartado.

 

Renascer

"Longa e fatigante é a senda ante ti, ó discípulo."
BLAVATSKY, Helena "A Voz do Silêncio", 1998, edição 494, tradução de Fernando Pessoa, Assírio & Alvim

No hiemal liame a Nix e Érebo, injucundo,
Estertora num búzio um mesto alburno
Num tal dédalo impérvio e taciturno,
Que plange Undina (1) em terra, contrafundo.

Mas "Deixa a dor nas aras"(2), sitibundo,
Pélago de Chopin num seu nocturno,
Prorrompe-lhe uma Lilith, lio diuturno, 
Transubstancia as Euménides segundo 

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