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A CIDADE CRESCE

A cidade cresce.

Os homens amesquinham-se entre os carros,

Que não têm por onde andar.

Árvores medrosas exibem nos ramos,

Folhas mortas de poluição.

E o homem, animal da orla da floresta,

Enfurece-se, qual fera cativa do cimento que o cerca,

Na nevrose quotidiana, que não ousa compreender,

Por indecifrável e vazia.

 

A cidade cresce.

As crianças surgem dos buracos das ruas.

Os drogados, vadios, abandonados,

Viram detritos nas portas de tascas e cafés.

FALSA APARÊNCIA

Pinta de branco o barro cru da jarra tosca.

Coloca-a numa sala entre sofás e livros raros.

Enfia-lhe flores vistosas, colhidas numa estufa.

Põe-lhe um selo, um carimbo, dá-lhe um rosto…

E terás falsa porcelana.

 

Traça a cinza veios em seu bojo,

Esfrega verniz. Na boca um aro dourado.

Coloca-a sobre um suporte de negro polido.

Dá-lhe lugar vistoso, na sala de visitas.

E terás belo mármore.

 

Deita-lhe água dentro.

Pouco a pouco…

Cai o verniz, abrem-se brechas na pintura.

ESTOU FARTO

Estou farto das caras sem olhos,

Que me olham.

Dos lábios sem fala,

Que me falam.

 

Dos que se sentam à mesa do café,

Só porque se sentam.

Dos cínicos servis, que me saúdam

Com pancadinhas nas costas,

Como Amigos.

Estou farto dos pobres e dos ricos,

Dos que me atacam pelas costas.

 

Por ser amigo…

Desilusões sofro.

Pouco lucro.

Nem Amigos.

Estes não se compram com gestos ou palavras;

Simplesmente, existem.

 

Marcam presença na própria ausência,

Não quero

     Não quero ouvir seu nome

     Nem o som do vento

    Tapei meus ouvidos

     Na janela cerrei os vidros

 

    Hoje foi minha escolha

    Acertada?  Talves!

   Amanhã quem sabe, te acolha

   Será somente mais uma vez

 

   Não quero, nem devo:-Nunca!

   Ouvir tuas mentiras

   Nem quero um amante varunca

   Nem um amor picotado em tiras

 

   Não mais te chamarei

  Teu nome... eu esqueci!

 

   Nereide

 

 

 

Rotas

Por vezes sei que me disperso
Nos escombros da essência...
É apenas um modo adverso
Adquirido pela inata prudência.

Por vezes sei que não me revês
Nas entrelinhas do amor.
É apenas a insensatez
Da minha condição indolor.

Sei que por vezes é preciso mais
Do que permanecer aqui
Ancorada neste cais.

Aguardo apenas as correntes favoráveis
Para navegar até ti
E velejar pelas rotas inimagináveis.

Miragem

Durante anos vagueei na ilusão.
Amei sem ser amada
E encurralei-me no beco da solidão
Julgando-me ignorante e fracassada.

Quis voar... e voei.
Caí na profundeza do oceano.
Andei perdida no mundo, mas gostei
De ser um ser desmedido e profano.

Depois parei... e inspirei.
Procurei a mutilada alma,
Vasculhei... E encontrei.

Abri os braços à vida
Sorrindo à brisa calma,
Sobrevivente da miragem sumida.

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