A CIDADE CRESCE

A cidade cresce.

Os homens amesquinham-se entre os carros,

Que não têm por onde andar.

Árvores medrosas exibem nos ramos,

Folhas mortas de poluição.

E o homem, animal da orla da floresta,

Enfurece-se, qual fera cativa do cimento que o cerca,

Na nevrose quotidiana, que não ousa compreender,

Por indecifrável e vazia.

 

A cidade cresce.

As crianças surgem dos buracos das ruas.

Os drogados, vadios, abandonados,

Viram detritos nas portas de tascas e cafés.

O QUE É VIVER?

 

O que é a vida?

É a subida da montanha por sendas misteriosas,

Entre árvores que abrigam e pedras que rolam?

Ou é a descida do caudal do rio,

Cortado por rápidos e correntes,

Que nos atiram contra pedras pontiagudas?

É o almejar atingir o cume iluminado,

Projetado no azul do céu,

Mas logo coberto de nuvens?

Ou é antever a foz e sonhar com o mar alto,

Que tanto nos liberta, como afoga?

É ver e cheirar flores campestres,

Crescendo em vales tranquilizantes?

FALSA APARÊNCIA

Pinta de branco o barro cru da jarra tosca.

Coloca-a numa sala entre sofás e livros raros.

Enfia-lhe flores vistosas, colhidas numa estufa.

Põe-lhe um selo, um carimbo, dá-lhe um rosto…

E terás falsa porcelana.

 

Traça a cinza veios em seu bojo,

Esfrega verniz. Na boca um aro dourado.

Coloca-a sobre um suporte de negro polido.

Dá-lhe lugar vistoso, na sala de visitas.

E terás belo mármore.

 

Deita-lhe água dentro.

Pouco a pouco…

Cai o verniz, abrem-se brechas na pintura.

ESTOU FARTO

Estou farto das caras sem olhos,

Que me olham.

Dos lábios sem fala,

Que me falam.

 

Dos que se sentam à mesa do café,

Só porque se sentam.

Dos cínicos servis, que me saúdam

Com pancadinhas nas costas,

Como Amigos.

Estou farto dos pobres e dos ricos,

Dos que me atacam pelas costas.

 

Por ser amigo…

Desilusões sofro.

Pouco lucro.

Nem Amigos.

Estes não se compram com gestos ou palavras;

Simplesmente, existem.

 

Marcam presença na própria ausência,

O MUNDO É DOS IGUAIS

Não mais tenazes de ferro quebrando os ossos,

Nem desertos, cheios de náusea e fome.

Não mais escravos.

 

No mundo não cabem eleitos e abandonados.

O Mundo é dos iguais.

 

Não mais metralhadoras cantando a canção da morte,

Nem mortos vivos, que no quotidiano se enterram.                                               

Não mais escravos.

 

No mundo não cabem vencidos e vencedores.

O Mundo é dos iguais.

 

Não mais napalm e fome na rota dos jatos,

Nem crianças órfãs das grades da prisão.

DE ORA AVANTE,,,

De ora avante…

Fica proibida toda a ideia de escravidão.

A dúvida perderá a forma de monstro,

Disforme e pegajoso, verde lodo.

Haverá sempre uma rosa vermelha no jardim;

Nove rosas vermelhas na secretária dos vivos.

Ninguém mais morrerá de inanição.

Não se poderá julgar louco qualquer sonho,

Mesmo arrumar carros nas árvores da praça,

Seguir pelas paredes nas horas de ponta.

Não haverá sonhos limitados à infância.

O homem fará amor na relva dos jardins

… Em noites de sol.

QUE IMPORTA

Que importa existirem crianças famintas,

Ao luar?

Se os Deuses acendem o fogo da guerra,

Prás alimentar.

Se os homens passeiam, com pés de ladrão,

Lançando granadas, sobre um outro irmão.

 

Que importa existirem cadáveres,

Por toda a cidade?

Se há quem se sinta dono da verdade.

Se aqueles que sofrem,

Julgam ter razão.

Lançam-se alicerces de nova prisão.

 

Que importa que haja ódio em toda a parte,

Se aos donos da guerra, nada há que os farte!

 

Do livro VIVENDO O POENTE

LIBERDADE - palavra mágica

Olhei.

Tempo e espaço parado.

Costas grudadas à terra nua.

E, essa imensa manta de estrelas…

Que tremeluzem,

Brilham,

Enganam,

Iludem.

Resto selvagem de homem nu,

Imolado no altar da Terra.

 

Na noite,

Corro atrás da palavra mágica.

Que abre portas,

Faz sorrir pedras,

Afasta corpos.

E,

Em troca,

Emoldura de sorrisos a noite fria.

 

Eleva-me ao pináculo do monte.

Protege-me da fúria das águas,

Quebra o vento.

SÓ o LIVRE É SIMPLES

A poesia é coisa simples.

Simples como a vida,

Na Terra onde ela existe.

Simples como bagos de orvalho,

Caindo de pétalas jovens,

Sobre terra virgem.

Simples como pássaros voando,

Vivos e livres.

Vivos por livres.

 

Olha os campos,

Olha as serras,

Olha os mares.

Tudo é simples.

Todo o belo é simples.

 

Deixa a máquina,

Suas engrenagens complicadas e frias.

Mãos alavancas, que enterram vida,

No jardim do terror, na aridez da guerra.

Dorme homem. Dorme.

Dorme homem. Dorme.
Dorme à direita do charco e, em sonho,
Liberta os pés do barro em que te atolas.

Dorme homem. Dorme.
Só em sonho pode surgir o riso feliz
Que ostentas e derramas na tez calosa.

Dorme homem. Dorme.
Deixa que a máquina role e escravize,
Que as algemas te apertem os pulsos,
Que vires peão no jogo da guerra.

Dorme homem. Dorme.
Dormindo justificas o estar parado,
Enquanto outros avançam sobre tuas costas.

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