DEVANEIO DE FLOR

 

 

 

1.

observo a flor

como quem fita o fulgor

de uma chama viva

sob a dócil bruma da manhã

 

2.

fantasia de humana feição

adorna seu contorno

natureza resoluta

que lhe constitui a beleza

 

3.

mas, se é flor apenas

-munida de sonhos

é o delírio que lhe sonha:

devaneio de sua vertigem

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

SOPRO

SOPRO
 
Existe... Tudo existe!
Do nada existe.
Do vazio? De um vácuo?...
O vácuo existe... Existe, sim!
Mas criado, do Alguém, criado!...
 
O antes, o  princípio!...
Antes?... Quando?
Não quando... Nem onde... Nem porquê...
Porque o antes, existe. Mas não o antes de tudo.
Existe?... Sim .. É?... Já antes de tudo...Era!
 
Existe tudo... até o que não se move!

Samurai

Minha haste finca na alma,
Presa na terra íngreme,
Soterrada na cruz que desalma
O sepulcro que se estremece.

Minha katana já não corta,
Inimigo não me teme,
Fui rasgado na faca torta,
E morto na vida tênue.

Sou samurai das mil sombras,
Nas catacumbas sou lembrado.
Não fui de seppuku ou sondas,
Fui de guerreiro a enterrado.

Janelas

Abertas no solilóquio do vento,
Abruptamente batem entre si,
Janelas batem pensamentos,
Por vezes frívolos, chocam-se.

A jovial janela interroga:
— Por que tão rígida és?
A outra responde na hora:
— Porque a chuva agride-me.

Sucinta e clara resposta
Por satisfeita ela cala.
‘’Por que a chuva e não a Lua?’’
Pensa a janela tapada.

DIA ATÍPICO

 

 

 

hoje farei diferente

todos meus atos rotineiros

 

vou dormir após acordar

e comer no almoço o jantar

 

vou rir das pequenas tragédias

e lamentar as vitórias que perdi

 

vou me vangloriar pelas penúrias

e chorar pelas fáceis luxúrias

 

mas não se espantem comigo

por este desagravo ambíguo:

 

é somente uma reflexão

sobre a casualidade da vida

 

 

 

Pages